A Filosofia africana

3. A Filosofia africana

«A cultura negra é como uma boa terra, propícia ao desenvolvimento da física que transforma o mundo.»      Abdoulaye Wade (presidente do Senegal)

3.1. Contextualização do debate sobre a Filosofia africana

3.1.1 Questões históricas
    O povo africano foi vítima da colonização europeia. Com as viagens apelidadas de «Descobrimento», os europeus conheceram outros povos, que foram julgados em comparação com os usos e costumes da cultura ocidental. Por isso, houve uma série de filosofias concebidas por ocidentais que se esforçavam por denegrir a personalidade dos negros no mundo. Os estudos da época, quer antropológicos, quer sociológicos, preocupavam-se em provar, em todos os sentidos, a superioridade dos povos do Ocidente em relação aos outros povos, sem que estes últimos, no entanto, tivessem respostas imediatas escritas para contrapor as teses dos ocidentais.

A Teologia, a Filosofia e o Direito desempenharam um papel fundamental neste processo.
  • A Teologia definiu o povo negro como descendente de Cham, um homem que viu a nudez do pai. Portanto, o homem negro aparece como símbolo de maldição. Neste caso, o negro pertenceria geração dos condenados de Deus.
  • Na Filosofia, Voltaire afirma, na sua obra História do Século XIV, que o povo mais elevada é o francês e o mais baixo é o africano; Jean-Jacques Rousseau diz que os africanos são bony selvagens; para Hegel, os africanos são povos sem historia e, por consequência, desprovidos de humanidade; Kant chega conclusão de que os africanos são povos sem interesse; Lévy Brhul proclama que os africanos tem uma mentalidade pré-lógica; por sua vez, Montesquieu afirma que os africanos são povos sem leis; os antropólogos Morgan e Tylor sustentam que a Africa é uma sociedade morta.
  • O monarca francês Luís X'IV escreveu O Código Negro, uma espécie de direitos dos senhores sobre os negros.
Não restam dúvidas, portanto, de que o Ocidente desencadeou uma teoria de dominação que gerou um profundo complexo de inferioridade nos africanos. Em Panafricunisme Communisme?, George Padmore diz que este facto provocou uma crise no pensamento, na palavra e no agir do homem africano, O ocidentalismo promovia, directa ou indirectamente, uma antropologia triunfalista, cujas teorias e doutrinas exaltavam uma classe que se autoproclamava herdeira exclusiva da humanidade inteira. Por essa razão, arrogava-se o direito de destruir, assumir ou «esmagar» os outros povos. Este tipo de antropologia poderia ser classificada como um verdadeiro «vandalismo» cultural, narcisista, agressivo e destruidor, como defende Lecrec na sua obra Crítica da Antropologia.
     Mais tarde, as ciências sociais e humanas realizaram novas abordagens, adoptando uma visão diferente em relação às culturas não-acidentais. Passaram a reconhecer que toda a cultura representa uma determinada civilização, independentemente da sua situação geográfica, histórica, social e económica.
      Contudo, não nos podemos esquecer de que o período em que a população africana viveu todas estas discriminações, foi tão longo e profundo que ainda hoje estas se encontram bem vivas na sua memória. Tal condiciona o seu comportamento: este fenómeno não só influenciou a mentalidade europeia, como também deixou marcas na mentalidade do próprio povo negro, visto que a sua autoestima ficou deveras afectada.
Fig.1: Colonialismo

É aqui que é necessária a intervenção do filósofo africano, para projectar a futuro homem africano, partindo da sua prévia história. Para tal, houve necessidade de reabilitar imagem do homem negro, estimulando a sua autoestima e mostrando-lhe que ele é um homem igual ao branco.
     Como se conseguiria convencer o homem negro, que sempre foi servo do branco, de que ele próprio é igual ao seu patrão?
      Esta tarefa difícil e árdua continua a ser realizada pelo filósofo africano, sobretudo junto das comunidades das zonas rurais e de áreas mais remotas, que ainda têm esta mentalidade. Foi para responder a esta preocupação que alguns pensadores africanos desenvolveram debates acesos sobre a existência ou não da Filosofia africana.

Vamos recordar...
- O homem negro, ao ser colonizado, perdeu o estatuto de «pessoa».
- Os colonizadores convenceram o homem negro de que não tinha valor,
- A Filosofia africana vem recuperar a auto-estima que o homem negro tinha perdido o tratamento esclavagista.

3.1.2. A existência ou não da Filosofia africana

    Esta discussão tem lugar pelo facto de alguns estudiosos africanos e não africanos terem apresentado ao mundo estudos sobre etnias africanas, denominando-os «Filosofia africana». Este grupo é composto por Anyanw, Placide Iémpels, Alexis Kagame, Mbiti, entre outros.
     A questão que os críticos colocam é se se pode falar de Física ou Química africanas da mesma forma que eles falam da Filosofia africana. Como obviamente a resposta é não, eles negam a ideia da existência de uma Filosofia africana. Figuram na lista dos críticos: Hountondji, Franz Chahay, E. Boulaga, M. Towa, Oruka, Weredu, entre outros. O problema fundamental do debate é mais o objecto de estudo do que a designação em si. Até certo ponto, os críticos abrem a possibilidade da existência da Filosofia africana, apresentando em que moldes tal Filosofia deverá ser concebida para que possa ser designada Filosofia africana.
   Nos parágrafos seguintes, estudaremos as correntes mais importantes da Filosofia africana, onde serão apresentadas, em linhas gerais, as razões de ambas as correntes.



Bibliografia
GEQUE, Eduardo; BIRIATE, Manuel. Filosofia 12ª Classe – Pré-universitário. 1ª Edição. Longman Moçamique, Maputo, 2010.

Comentários