A História entre as ciências

A História entre as ciências

A interdisciplinaridade
Que lugar ocupa a História no sistema das ciências? A tendência actual de uma História total baseada na longa duração impõe História um diálogo com as restantes ciências sociais e humanas, a interdisciplinaridade, a fim de captar o social na sua totalidade.

A ideia de uma História total, que aborde o Homem sob diversos aspectos da sua Vida, só pode ser materializada com recurso ao conhecimento de outras ciências.

Mas a História não se limita a buscar subsídios das outras ciências. Ela também contribui para o desenvolvimento das mesmas, transmitindo-lhe a dinâmica da duração.

Noções sobre epistemologia da História

Sobre a origem do conhecimento
Conhecimento é o reflexo activo e devidamente orientado do mundo objectivo e das suas actividades no cérebro humano. Produz-se através dos órgãos dos sentidos, do sistema nervoso e do cérebro em particular.

Etapas da produção do conhecimento

1.a Etapa – o ser humano capta a realidade que o circunda através dos órgãos sensoriais: visão, olfacto, audição, gosto e tacto. O seu cérebro responde, da forma mais fiel, à realidade, e fixa-a através da memória.

A realidade vivida, uma vez captada e assimilada pelos diversos órgãos sensoriais, passa a fazer parte do conhecimento. Nesta primeira fase temos o conhecimento concreto ou sensorial, porque resulta da apreensão directa da realidade pelos órgãos dos sentidos.

Entretanto, o ser humano, com a ajuda de instrumentos científicos, pode ainda ampliar o conhecimento sensorial, redundando tal em seu próprio benefício.
2.a Etapa – o cérebro trabalha os conhecimentos já adquiridos. Analisa-os, relaciona-os e transforma-os em ideias.

A relação entre conhecimento sensorial e conhecimento lógico

O conhecimento sensorial e o conhecimento lógico interpenetram-se. O conhecimento sensorial é incapaz de revelar a natureza íntima das coisas, a sua essência e as leis do seu desenvolvimento. Com a ajuda dos órgãos dos sentidos é possível contemplarmos uma lâmpada eléctrica, mas não se pode imaginar que a corrente eléctrica é um fluxo de electrões que se movem a determinada velocidade.

Por meio dos sentidos não se pode perceber o movimento das partículas «elementares» e muitos outros fenómenos complementares da natureza e da Vida social. É sabido, também, que o conhecimento das leis, das essências das coisas e das leis, pode servir de guia ao ser humano na sua actividade prática. É aí que o pensamento lógico ou abstracto, entra em sua ajuda.

Por outras palavras, o conhecimento lógico é uma etapa qualitativamente nova e superior no desenvolvimento do conhecimento. O seu papel consiste em revelar as propriedades e os traços principais do objecto.

Na fase do pensamento lógico, são conhecidas as leis de desenvolvimento da realidade, tão necessária na sua actividade prática. O conhecimento lógico e o sensorial formam, por conseguinte, uma unidade, complementando-se um ao outro, enriquecendo-se reciprocamente. Não se pode subestimar nem as indicações dos sentidos nem as conclusões da razão.

No entanto, os representantes do empirismo subestimam o papel do pensamento abstracto no conhecimento; consideram que somente a experiência sensorial dá ao ser humano o verdadeiro quadro do mundo.

Partindo do facto de que as noções não têm evidência sensorial, os empíricos afirmam que na realidade nada corresponde às noções, que elas são fruto da fantasia do ser humano.
Em contrapartida, os racionalistas não acreditam nos órgãos dos sentidos e consideram a razão e o pensamento abstracto as únicas fontes do verdadeiro conhecimento. Os racionalistas subestimam o papel do conhecimento sensorial e consideram que o ser humano é capaz de conhecer o mundo de forma puramente intuitiva, fora de qualquer experiência.

Na nossa abordagem à problemática do conhecimento, vimos que as primeiras etapas deste compreendem o conhecimento sensorial e o abstracto.
Contudo, não é a esse nível que ele termina, a sua formação prossegue até níveis mais elevados, nomeadamente a percepção e a representação.

3.a Etapa – a percepção e a representação. A percepção é a forma mais alta do conhecimento sensorial. Reflecte o objecto na integridade sensorial imediata, no conjunto dos seus aspectos e particularidades externas.
A representação é a reprodução, na consciência do ser humano, de algo que foi percebido anteriormente: a reprodução de um acontecimento, agradável ou desagradável.

A prática como suporte do conhecimento

«... a fé, se não tiver obras, está morta em si mesma» (Tiago, 2:17).
A experiência acumulada ao longo dos séculos confirma a transcrição supracitada. O conhecimento sensorial e o abstracto são unidos: reflectem o mesmo mundo Natural, cuja base é a prática da humanidade. Ambos os graus de conhecimento têm uma base filosófica - o sistema nervoso do Homem.

A prática corresponde à actividade dos homens, cuja finalidade é transformar a Natureza e a sociedade em seu proveito. A sua essência é o trabalho, que fomenta a produção material e espiritual. É ainda o principal eixo da luta política e da luta de classes sociais, assim como a experimentação científica.

prática constitui o ponto de partida e a base do conhecimento. Porquê? Em primeiro Plano, porque o próprio conhecimento surgiu na base da prática, em particular, sob a influência da produção material.

É já de domínio comum que, desde a Antiguidade, o Homem sentiu a necessidade de ter de trabalhar para obter os meios para a sua subsistência. No decorrer do processo produtivo confronta-se, frequentes vezes, com as forças da Natureza que, gradualmente, ia conhecendo e vencendo, transformando-as e pondo-as ao seu serviço.

O desenvolvimento da produção ia, entretanto, exigindo crescentemente mais e novos conhecimentos. Já em períodos anteriores, o Homem viu-se na contingência de medir áreas de terra, de contar os instrumentos de trabalho e os produtos fabricados. Na sequência disso, surgiram os primeiros conhecimentos, por exemplo, a matemática. O Homem edificou habitações, construiu estradas, sistemas de irrigação e outros empreendimentos. Tudo isto implicava o conhecimento das leis da mecânica. Assim, sob o impulso das necessidades práticas, desenvolviam-se as capacidades mentais do Homem que fez surgir as ciências. A prática serviu também de base para o aparecimento das ciências sociais.

Em definitivo, a prática apetrecha o conhecimento científico com aparelhos, instrumentos e equipamentos e, deste modo, contribui para o êxito do conhecimento.

A questão da verdade em História

Verdade – designa aquilo que é firme, digno de confiança, estável, fiel, verdadeiro ou facto estabelecido; aquilo que se ajusta aos factos ou ao que é direito e apropriado; conformidade entre o pensamento ou a sua expressão e o objecto de pensamento; coisa certa e verdadeira; a verdade como conhecimento que corresponde às ligações e leis essenciais da realidade objectiva.
Há vários tipos de verdade, mas interessam-nos dois tipos de verdade:
  • A verdade relativa, que é a correspondência incompleta entre o conhecimento e a realidade.
  • A verdade absoluta, que é a verdade precisamente objectiva na sua plena integridade; é o reflexo absoluto da realidade. A verdade absoluta põe em destaque a cognição, incluindo a cognição científica e o processo histórico da prática.
Mas vejamos: de que depende a verdade? Do Homem ou do objecto?

Dois sistemas filosóficos apresentam soluções divergentes:

O primeiro afirma que a verdade é subjectiva e depende do Homem, que determina, ele próprio, a veracidade dos seus conhecimentos sem levar em conta a situação real das coisas; esta é a concepção idealista.

Baseando-se nas conquistas da ciência e da prática secular do Homem, o segundo sistema afirma que a verdade é objectiva e, uma vez que reflecte o mundo que existe objectivamente, o seu conteúdo não depende da consciência do Homem; esta é a concepção materialista.

Como é possível ao Homem conhecer a verdade objectiva? De urna vez? Na integra? A solução é-nos dada por aquilo que é chamado «correlação entre a verdade absoluta e a verdade relativa». As diferenças entre a verdade absoluta e a relativa devem-se ao facto de que o grau de correspondência dos conhecimentos com a realidade e o grau de penetração do intelecto na realidade não são iguais.

Alguns conhecimentos correspondem realidade na integra, de forma absolutamente exacta, enquanto outros apenas parcialmente.
A verdade absoluta é precisamente a verdade objectiva na sua plena integridade, é o reflexo absoluto da realidade.

A verdade absoluta pode, por um lado, ser conhecida na integra, pois não existem coisas incognoscíveis, não existe limite para a capacidade cognitiva do intelecto humano, por outro, não se pode conhecer a verdade absoluta logo de uma vez, na integra, só pode ser alcançada no processo infinito do conhecimento.

Cada nova conquista da ciência aproxima o Homem do conhecimento da verdade absoluta; permite-lhe conhecer novos elementos da verdade, seus novos elementos e aspectos. O progresso do Homem, no domínio do conhecimento, consiste precisamente em que o Homem, ao conhecer as verdades relativas, conheça também a verdade absoluta.

O conhecimento é, por conseguinte, ao mesmo tempo absoluto e relativo. É relativo porque não é completo, desenvolve-se e aprofunda-se, descobrindo novos aspectos da realidade. É absoluto, porque contém os elementos do conhecimento eterno e absolutamente exacto.
Finalmente, chegamos à parte crucial do nosso problema: o conhecimento histórico será absoluto? Será relativo?

A resposta mais consequente é: Não há verdades definitivas em História. A verdade histórica é parcial, frágil e relativa.





Bibliografia
SUMBANE, Salvador Agostinho. H11 - História 11ª Classe. 2ª Edição. Texto Editores, Maputo, 2017.

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