Filosofia profissional e critica à Etnofilosofia

3.2.2. Filosofia profissional e critica à Etnofilosofia

Os críticos da Etnofilosofia defendem que não podemos confundir o emprego do termo «filosofia», usando-o no sentido ideológico. «Filosofia» é uma palavra que se utiliza para designar uma ciência rigorosamente científica. Reivindicar que os africanos têm a sua própria filosofia seria cair nas mãos dos colonizadores, que querem dar ou manter a ilusão de que os africanos têm uma filosofia, porque o que nós temos realmente são mitos, crenças e provérbios.
     Paulin Hountondji (Benin) é um dos grandes críticos e vale-se dos seguintes argumentos, expressos na obra African Philosophy, Mythe and Reality, de 1974.
  • 1. Reivindicando que existe uma Filosofia africana, estamos d cair na ratoeira colonialista e racista que insiste que um africano é diferente de um europeu. Portanto, qualquer referência à Filosofia africana obriga-nos a definir África em relação Europa. Logo, não podemos aceitar que haja uma Filosofia africana que claramente nega a Filosofia em geral.
  • 2. Filosofia, no seu sentido restrito, é uma disciplina científica, teorética e individual, assim como a Linguística, a Álgebra e, portanto, não se pode substitui-la por crenças populares, práticas tradicionais e comportamento popular de um povo qualquer. A Filosofia não se deve identificar com o mito ou com a religião tradicional.
  • 3. A Filosofia, enquanto disciplina científica, teorética e individual, emerge sempre em oposição ao mito, às religiões tradicionais e ao seu respectivo dogmatismo e conservadorismo.
O que é dogmático não pode ser filosófico. A relação filosófica com o mito e as religiões tradicionais não é uma relação arquivista ou arqueológica com função de sistematização e perpetuação, nem sequer é uma protectora desse passado popular, muito pelo contrário
A relação da Filosofia com mito e a religião tradicional é de continuidade, consciente e de critica continua da tradição do povo face aos desafios que o povo tem de enfrentar no presente e no futuro. Portanto, a Filosofia deve abrir os horizontes do povo para que este consiga enfrentar os desafios do futuro. Querer que a Filosofia africana exista não tem sentido.
  • 4. Todo o projecto de edificar uma Filosofia africana é um projecto europeu de demarcar a todo o custo a civilização africana da europeia. Por isso, dizer que os africanos têm a sua própria civilização quer dizer que a civilização africana é fixa e está mumificada nas tradições antigas, que todo o poder do africano reside no passado, nas tradições dos seus antepassados.

Os filósofos que encaram a Filosofia a partir do ponto de vista do passado designam-se por etnofilósofos e são europeus. Tentam sufocar a capacidade criativa dos africanos porque esperam que os filósofos africanos sejam simples ativistas das suas tradições culturais, em vez de pensadores originais.
  • 5. Todos concordamos que a Filosofia africana não pode nascer ex nihil (do nada), mas que necessariamente parte da herança cultural. Contudo, esta herança cultural não consiste apenas em olhar para atrás. A Filosofia africana deve ser urna confrontação criativa das suas ideias com o presente e o futuro.
  • 6. O papel criador da Filosofia africana tem de ser desempenhado por filósofos africanos que são sujeitos da actividade filosófica. A africanidade da Filosofia africana só emerge a partir de uma actividade filosófica de discussão e critica dos africanos que são filósofos. A africanidade consiste na pertença dos filósofos ao continente africano. A africanidade não consiste em falar da África ou em tratar de problemas africanos, pelo contrário, consiste na partilha e na conversa entre africanos que são filósofos qualificados e profissionais que usam a razão de maneira critica e criadora.

Hountondji afirma que o problema que se coloca é substancialmente a associação da ideia de filosofia palavra «africana», que a qualifica, deixando em dúvida se a palavra «filosofia» ainda mantém o seu significado original.
      Na opinião deste critico, a universalidade da Filosofia deve ser conservada. No entanto, isto não significa que a Filosofia deva tratar necessariamente os mesmos temas ou fazer as mesmas perguntas, até porque as diferenças de conteúdos são consideráveis.
      É preciso salientar que os primeiros propagandistas da Filosofia africana foram homens da Igreja, como, por exemplo: Tempels (belga), Alexis Kagame (ruandês), John Mbiti (queniano) e Vicente Mulago (congolês) Estes pensadores queriam somente encontrar bases psicológicas para implantar o Evangelho no terreno africano, sem prejudicar ninguém.
Fig.4: Paulin Hountondji

     Quando a palavra «filosofia» é qualificada pela palavra africana» não tem o mesmo significado que a Filosofia ocidental do século XIX.
      «Parece-me que uma palavra muda o seu significado se é aplicada à Europa e América em vez da -Africa. Este é um fenómeno comum, como o nosso amigo Odera (queniano) humoristicamente comenta: "o que é superstição é apresentado camo religião africana. Do Ocidente espera-se que diga que é mesmo assim, religião africana; o que é mito é apresentada pelos africanos como Filosofia africana, e os africanos estão 5 espera que os ocidentais confirmem que não é mito, mas Filosofia africana. O que é claramente ditadura é considerado democracia africana e espera-se que a cultura europeia apoie dizendo que é mesmo assim." Nós manipulamos as palavras em nome da cultura africana.
     O que é pseudo-desenvolvimento (desenvolvimento da elite, favoritismo) é descrito em Africa como desenvolvimento cultural e esperamos que o Ocidente aplauda tudo isto como desenvolvimento africano.» Portanto, segundo Hountondji, as palavras mudam de significado quando passam do contexto europeu para o contexto africano.

Vamos recordar...
Os filósofos Críticos da Etnofilosofia recusam-se aceitar a abordagem etnofilosófica Como sendo Filosofia africana porque, no seu entender, reforçaria a ideia da diferença entre africanos e europeus (forma inferior de fazer Filosofia).
A ideia de Filosofia africana deve ser aliada projecto de critica e reflexão de africanos sobre os problemas de África.

Bibliografia
GEQUE, Eduardo; BIRIATE, Manuel. Filosofia 12ª Classe – Pré-universitário. 1ª Edição. Longman Moçamique, Maputo, 2010.

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