Noções básicas conhecimento

Noções básicas conhecimento, conceito e realidade, elementos do conhecimento e faculdades de conhecimento

Conhecimento e seus elementos

Desde a Antiguidade Grega, quase todos os filósofos se preocuparam com o problema do conhecimento humano; problema que envolve questões extremamente importantes, como: O que é o conhecimento? O que é a verdade? É possível o conhecimento? Qual é o fundamento do conhecimento?

Todas estas questões são tratadas por uma disciplina filosófica que costuma ser designada por diversos nomes: Teoria do Conhecimento, Gnosiologia, Critica do Conhecimento ou Epistemologia. Neste livro, utilizaremos a denominação de Teoria do Conhecimento.

A Teoria do Conhecimento consiste numa reflexão filosófica sobre o conhecimento, tendo como objectivo investigar as suas origens, as suas possibilidades, os seus fundamentos, a sua extensão e o seu valor.

Embora o problema do conhecimento tenha preocupado os filósofos da Antiguidade, somente a partir da Idade Moderna a Teoria do Conhecimento adquiriu grande importância, passando a ser tratada como uma das disciplinas centrais da Filosofia. Para esse processo de valorização da Teoria do Conhecimento colaboraram as obras do filósofo francês René Descartes (1596-1650) e do filósofo alemão Immanuel Kant (1724-1804).

Para que exista o acto de conhecer, é indispensável o relacionamento de dois elementos básicos: um sujeito conhecedor e um objecto conhecido. A relação que se estabelece entre os dois elementos, em que o sujeito apreende o objecto, chama-se conhecimento. Portanto, no acto de conhecer é essencial a presença do sujeito conhecedor e do objecto conhecido.

Segundo Nicolai Hartmann (1881-1950), o conhecimento é um acto transcendente, no sentido em que se realiza não apenas na consciência ou representação mental do objecto, mas ultrapassa a consciência inicial do sujeito, ligando-a ao objecto existente a ser conhecido. Conhecer é captar o objecto.

Quando o sujeito capta o objecto, tendo dele uma fiel representação mental, podemos dizer que atingiu um conhecimento verdadeiro, ou de carácter parcial, isto é, não totalmente abrangente. Quando isso não ocorre, o sujeito tem um conhecimento parcial ou falso do objecto.

Todo o conhecimento é conhecimento do mundo. Este entendido como toda a focagem da realidade a partir de um centro de actividade e de compreensão, que é o próprio Homem. Pela simples presença no meio das coisas, o Homem confere-lhes um significado, organizando-as num campo gnosiológico.

Conceito de realidade

A noção de realidade é extremamente ampla e polissémica (mesmo para cada um de nós, ela não tem sempre o mesmo sentido) e, consequentemente, não parece ser independente daquele que a apreende, isto é, a realidade é sempre realidade para alguém.

Pergunta-se: segundo o senso comum, a noção de realidade é uma noção unívoca? Porquê? Façamos uma pesquisa na comunicação social (jornais, revistas, televisão, etc.) acerca de um determinado acontecimento e confrontemos os modos como ele é visto e apreciado: tratou-se da mesma realidade para todos? Que podemos concluir acerca da objectividade do real?

Sendo assim, a noção de realidade é necessariamente problemática que, como tal, exige questionamentos, reflexão... como vamos entendê-la?

Uma primeira aproximação poderá ser: vulgarmente, realidade é tudo aquilo que efectivamente existe. Portanto, equivale ao ser ou existente, que, como tal, se impõe e resiste a todas as tentativas de esquecimento ou negação. Tanto pode designar um ser particular, como um conjunto de todos os seres em geral.

Está claro que tal noção, baseada na experiência imediata, pode satisfazer a nossa consciência utilitária, os interesses da nossa Vida diária. Porém, é manifestamente insuficiente para uma consciência filosófica que se pretende exigente e radical. Com efeito, facilmente nos damos conta de que os objectos matemáticos, sendo ideais, não deixam de ser reais; uma intenção ou projecto (cientifico, técnico, artístico, politico, humanitário,...) tem a sua realidade e faz surgir novas realidades; um simples sonho é realidade que, aliás, as ciências hoje procuram decifrar e compreender... tudo isto nos obriga a uma nova reflexão, de modo a chegarmos a uma nova experiência mais profunda e original.

Num outro sentido, podemos entender a realidade como aquilo que encontramos ou podemos encontrar, de um modo ou doutro, este termo «realidade», designa, pois, aquilo que há (...); o Homem tem de confrontar-se com aquilo que há, e este ter de confrontar-se não é algo secundário ou pontual, antes pertence à sua própria essência: o Homem está com as coisas, aberto a elas, fazendo algo com elas e, portanto, o que há é constitutivo seu.

Quer dizer, eu apenas sou confrontando-me com aquilo que há, e esse ter de (...) é justamente o que confere o seu carácter real as coisas, carácter que possivelmente não tem para o animal. Porque este, que está entre as coisas, utiliza-as, procura-as, protege-se contra elas, foge da sua ameaça, mas não tem de confrontar-se com elas.

Assim, chegamos a um outro conceito de realidade: o mundo do Homem, que é também o mundo para o Homem, pois é nele que vive aquilo que chamamos a «experiência humana», a qual diariamente se enriquece, diversifica e aprofunda.

Por isso, os filósofos, a partir do século XX, têm insistido nesta relação indissociável entre o Homem e o seu mundo: usando a expressão de um dos mais célebres filósofos, M. Heidegger (1889-1976), o Homem é o Dasein, isto é, o ser-aqui, não o ser isolado, mas o ser-no-mundo, o ser lançado entre as coisas e os outros Homens.

Podemos concluir que o Homem constitui, para si próprio, um problema? Esta interrogação é, de início, fundamentalmente utilitária, ela visa a sobrevivência e, portanto, a adaptação à realidade; e esta é sentida simultaneamente como obstáculo e como instrumento que lhe permite viver.
Fig. 2: Martin Heidegger (1889-1976)

Acontece, porém, que se olharmos as crianças, a partir de um determinado momento, bem cedo, o questionamento do Homem perante o real circundante não consiste apenas em confrontar-se com ele, para dominá-lo, utilizá-lo ou proteger-se contra ele. O Homem quer conhecer aquilo que o cerca, quer explicá-lo e compreendê-lo. Em suma, cada vez mais, o Homem quer saber o que é, e acerca do que há.

As respostas a estas interrogações foram, primeiro, de carácter acentuadamente emotivo e imaginativo; tornaram-se, depois, progressivamente teóricas e racionais. Mito, ciência e filosofia são, deste modo, as vias de acesso ao real; são elas as três grandes abordagens que o Homem tem utilizado para confrontar-se com o seu mundo e indagar acerca da realidade.

Faculdades do conhecimento

O conhecimento é construído e aperfeiçoado através de mecanismos que vão desde sistemas simples e naturais, a sistemas complexos que envolvem elementos artificiais.
De forma mais elementar e numa fase inicial, o conhecimento é constituído a partir de mecanismos inerentes aos sentidos naturais e as experiências sociais, que podem ser: sensação, percepção e representação.

Nos três casos, o conhecimento é superficial, parcial e incompleto, não havendo conhecimento do objecto integral nem a sua essência.

Na sensação é predominante o conhecimento das partes e/ou particularidades do objecto, sendo o mesmo adquirido através duma acção directa de sentidos naturais (visão, olfacto, tacto...) sobre o objecto do conhecimento, ainda que com a ajuda de instrumentos.

Na percepção, o objecto é conhecido de maneira superficial e geral, através de um conjunto de sensações, sendo pouco significativo o conhecimento das partes e as suas particularidades.

A representação corresponde a uma imagem do objecto construída sem o contacto directo com o mesmo, a partir de sensações ou percepções ocorridas em contacto directo anterior com o objecto; ou a partir da sua descrição ou de um conhecimento indirecto do mesmo.

Os conhecimentos correspondentes à sensação, à percepção e representação são mediados pela experiência pessoal, pelo conhecimento acumulado que tenha o observador e, muitas vezes, por preconceitos, superstições e por factores inerentes cultura e aos interesses pessoais e sociais dos indivíduos.

O conhecimento, em geral, é expresso na forma de uma proposição apresentada através de uma sentença, sendo que uma mesma proposição pode corresponder a mais de uma sentença e uma sentença pode corresponder a mais de uma proposição.

O conhecimento mais sofisticado, tal como aquele que é elaborado no processo escolar e nas actividades académicas e científicas, é construído através de mecanismos mais complexos, relacionados com o pensamento abstracto e generalizado e permite o conhecimento integral do objecto: a sua essência, isto é, os seus atributos essenciais; as suas partes e particularidades e o seu aspecto geral. Os conhecimentos mais elaborados são construídos através de processos científicos, cujos mecanismos centrais são: o conceito, o juízo e o raciocínio.

Enquanto o processo espontâneo de construção do conhecimento é mediado por distintos factores que se situam fora do controlo do individuo e, por isso, o conhecimento contraído é superficial e não universal no processo cientifico a construção do conhecimento ocorre a partir de estruturas lógicas e através de investigação cientifica, o que assegura a penetração na essência do objecto e a sua universalidade com uma interferência mínima ou nula de elementos factuais ou circunstanciais.


Bibliografia
CHAMBISSE, Ernesto Daniel; COSSA, José Francisco. Fil11 - Filosofia 11ª Classe. 2ª Edição. Texto Editores, Maputo, 2017.

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