Os novos domínios da Lógica e as suas implicações

Os novos domínios da Lógica e as suas implicações

Pela necessidade de articular a Filosofia com a experiência real dos leitores, vamos neste capítulo mostrar que a Lógica não é uma disciplina meramente teórica ou formal. Ela conhece hoje um campo prático de aplicação que inclui novas ciências e tecnologias como a Cibernética, a Informática e a Inteligência Artificial.
    A analogia estabelecida entre o comportamento humano e o comportamento das máquinas é antiga.
   Ao longo da história, encontramos algumas tentativas de transpor para as máquinas os automatismos do comportamento humano.

Por razões óbvias, não pretendemos apresentar, aqui e agora, a história desta analogia entre o comportamento humano e o comportamento das máquinas. O que vamos oferecer deve ser visto apenas como ponto de partida para a investigação-reflexão, uma vez que estes novos domínios da aplicação da Lógica colocam problemas de natureza filosófica. E são esses, sobretudo, nos quais aqui urge pensar.
    Contudo, sabe-se que o despertar da Lógica e sua renovação como actividade de matemáticos e não exactamente de filósofos, isto é, a Lógica restaurada com base em interesse dos matemáticos e da descontinuidade da tradição filosófica da ordem metafisica.
A ideia era de que não se devia continuar a ligar a Lógica à Metafísica, mas sim, às matemáticas.
      Neste sentido, a Lógica é comparada à Geometria que assenta em verdades axiomáticas, cujos teoremas são construídos com base em teoria geral do simbolismo que constitui o fundamento daquilo que é reconhecido como análise.
     A matematização da Lógica levou a que esta fosse concebida por analogia com a Álgebra, e a Lógica contemporânea foi vista como Cálculo, tal como acontece com Álgebra. Neste caso, a Lógica e a Álgebra funcionam na base de leis do pensamento humano.

George Boole (1815-1864) abre uma nova perspectiva da Lógica ao elaborar a teoria da dedução logística para as investigações lógicas, que se traduziram num campo de novos domínios da aplicação da lógica, como a seguir vamos analisar.

Cibernética
A palavra «cibernética» tem a sua origem no grego kibernétes. Platão usou o termo e com ele pretendia designar «a arte de pilotar navios». É nesta raiz grega que se filia também a palavra latina gubernare, que origina o termo «governo». Tal como o piloto dirige o navio, assim o governo é o timoneiro que dirige o Estado.

A teoria da cibernética remonta a 1948 e deve a sua origem ao matemático norte-americano Norbert Wiener (1895-1964). Podemos defini-la genericamente como a ciência da comunicação e do controlo de homens e máquinas. É no seio deste movimento de ideias que vimos surgir o primeiro computador da nossa era e será igualmente fruto do seu trabalho que se desenvolve a posterior robotização.

Fig. 5 Norbert Wiener (1895-1964)

Informática

O termo «informática» foi criado em 1962 por Philippe Dreyfus. Contudo, foi introduzido oficialmente na Academia Francesa de Ciências em 1966. A informática foi então definida como «ciência do tratamento racional, nomeadamente por máquinas automáticas, da informação considerada como suporte dos conhecimentos e das comunicações nos domínios técnico, económico e social.»
      Apesar de o termo ter surgido nesta altura, os estudiosos destas temáticas dizem-nos que a informática começou a ser um domínio autónomo por volta dos anos 50. São, entre outros, marcos importantes da constituição dessa autonomia os seguintes:
  • O Congresso de Paris de 1951.
  • O primeiro computador baseado na tecnologia dos transístores (Bell-1 955).
  • A linguagem de alto nível (Basic-1954; Fortran-1957; Cobol-1960).

Entre 1945 e meados dos anos 60 surge a primeira informática. Dá-se o aparecimento dos primeiros computadores propriamente ditos. O ENIAC é o primeiro exemplar. É o período da definição dos princípios básicos, da definição do corpo teórico e técnico. Nos anos 60 até os finais dos anos 70, surge a segunda informática, desenvolvem-se os computadores baseados na técnica dos transístores e os computadores pessoais. Nos anos 80, surge a terceira informática, com o aperfeiçoamento dos computadores pessoais das redes e da microinformática. É o que poderíamos chamar banalização dos computadores pessoais e transformação da sociedade da informática numa cultura de comunicação, frutos que colhemos actualmente.

Inteligência artificial
A inteligência artificial é um domínio relativamente recente. Encontramos as suas raízes no grande desenvolvimento dos computadores dos anos 50. Porque estas máquinas ofereciam enormes possibilidades de armazenamento e processamento de informação a altas velocidades, os investigadores apostaram em construir sistemas que em tudo se assemelhassem às potencialidades da inteligência humana.
    Podemos dizer que a inteligência artificial se inspira na inteligência natural própria dos seres humanos. Para uma melhor compreensão da relação entre inteligência natural e inteligência artificial é preciso delimitar o conceito de inteligência.
    Assim, quando dizemos que os seres humanos são inteligentes, estamos a pensar nas suas habilidades para adquirirem, compreenderem e aplicarem certos conhecimentos, bem como nas capacidades para exercitarem o seu pensamento e raciocínio. Sabemos ainda que a inteligência é mais do que isso. A inteligência engloba todo o conhecimento, consciente ou inconsciente, que fomos adquirindo ao longo da nossa Vida, fruto do estudo, ou em resultado das multifacetadas experiências que realizamos, das muitas situações mais ou menos problemáticas que fomos ou vamos enfrentando.
     Será que os seres humanos serão capazes de construir sistemas de inteligência artificial que demonstrem tais características?

Noções básicas da Lógica
Etimologicamente, lógica significa «ciência do logos». Mas se considerarmos que logos significa «razão, palavra, proposição, oração, pensamento, discurso ou linguagem», a noção pode tornar-se equivoca.
    Enquanto ciência do logos, a Lógica pode ainda ser definida etimologicamente como ciência da razão ou do pensamento» ou «como ciência do discurso racional» ou ainda como a «ciência que estuda a dimensão racional do discurso».
     Podemos então dizer que a tarefa da Lógica é o estudo das condições de pensamento válido, isto do pensamento que procura alcançar a verdade. A tarefa deve regular o perfeito discurso da razão e oferecer o caminho para o correcto exercício da linguagem e do pensamento na procura da verdade.

Validade formal e validade material
Sendo a Lógica uma ciência autónoma, tem por isso o seu campo específico de estudo. Enquanto as outras ciências, como a Física, a Biologia, a Química, a História, etc., se preocupam com a validade material dos seus enunciados, a Lógica considera mais a validade formal. Sintaticamente é correcto, não há qualquer contradição, não há qualquer incorreção gramatical, não há falta de coerência. Do ponto de vista lógico é formalmente válido, correcto e legitimo.
     Quando é que podemos dizer que um enunciado, um juízo, um pensamento, tem validade formal e material?
    Tem validade formal quando os elementos que o constituem (conceitos no juízo e juízos no raciocínio) formam um todo coerente, sem contradição interna e quando os seus elementos não são incompatíveis.

Exemplo:
A é A, A não é B.

Todo o pensamento verdadeiro implica a co-presença da validade formal e material. Mas atenção: a Lógica ocupa-se apenas da validade formal do pensamento, enquanto as outras ciências se preocupam com a validade material.
     Uma vez que a verdade implica simultaneamente a validade formal e material, as ciências não podem deixar de se servir da Lógica. Só usando a Lógica podem proceder de acordo com as regras formais do pensamento. É por isso que a Lógica deve ser encarada como uma ciência em si mesma e como um instrumento ao serviço das outras ciências.
  A Lógica formal faz a abstracção, do conteúdo ou matéria dos raciocínios e das proposições, para considerar apenas a forma: ela estuda as condições formais do pensamento válido. Diz-se que regula o acordo do pensamento com ele mesmo, quer dizer, a coerência do pensamento. Estas condições formais são necessárias, mas não suficientes. Para atingir a verdade, têm de ser preenchidas, mas o seu preenchimento não leva necessariamente verdade. Tal é o caso em que se raciocina formalmente de forma correcta a partir de falso testemunho (erro material).
   A Lógica ou metodologia aplicada tem em conta a matéria dos raciocínios e das proposições, examina as condições de concordância do pensamento com a realidade (verdade material). Tal como as ciências procuram precisamente realizar, cada uma no seu domínio, esta concordância do pensamento com o real, também a Lógica aplicada estuda os diferentes métodos utilizados nas ciências (Matemática, Ciências Naturais, Psicologia, Sociologia, História, etc.), tanto como métodos de investigação ou como métodos de verificação; daí o nome de metodologia.
    As condições necessárias e suficientes para atingir a verdade consistem, ao mesmo tempo, na existência de concordância do pensamento consigo próprio e do pensamento com a realidade, isto é, na união da verdade formal com a verdade material. As ciências esforçam-se sempre por realizar esta dupla concordância.


Bibliografia
CHAMBISSE, Ernesto Daniel; COSSA, José Francisco. Fil11 - Filosofia 11ª Classe. 2ª Edição. Texto Editores, Maputo, 2017.

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