Principais correntes da Filosofia africana

3.2. Principais correntes da Filosofia africana

3.2.1. Etnofilosofia
Trata-se do «grito» de africanos e africanistas pelo reconhecimento do negro como homem.
Estes produziram obras em defesa do homem negro. Uma das formas de realizar essa defesa é através da Etnofilosofia. Os etnofilósofos são assim denominados por terem feito estudos sobre etnias africanas. Estes defendem que toda a Filosofia é uma Filosofia cultural, isto é, ninguém faz Filosofia sem se basear em alguma cultura. Para Anyanw, a missão do filósofo africano é compreender e explicar os princípios sobre os quais se baseia cada urna das culturas africanas.
    Todavia, as suas pesquisas, que se apelidaram de Filosofia africana, foram alvo de severas críticas, principalmente pelas seguintes razões.
  • As abordagens feitas por tais intelectuais descreviam, na sua maioria, práticas habituais dos africanos, afirmando-se como Filosofia africana.
  • Estes estudos, quando eram feitos por africanistas não-africanos, denegriam o africano. O sacerdote belga Placide "IOmpels, por exemplo, dizia que o africano tinha uma lógica menor.
  • Uma simples catalogação de mitos, crenças e provérbios considerava-se Filosofia africana.
  • Estes estudiosos abordavam Lemas relativos a etnias africanas. Alexis Kagame, por exemplo, inspirando-se na filosofia aristotélica, escreveu uma obra intitulada A Filosofia Bantu-Ruandês do Ser, onde desenvolvia a sua reflexão, trazendo tona as categorias aristotélicas do ser, através da análise gramatical rigorosa das estruturas linguísticas. A partir desta obra, vários estudantes africanos defenderam as suas teses, cada um deles com a holófita bantu da sua língua vernácula.
  • Tempels dizia que existe uma filosofia do negro, só que esta é diferente na forma e no conteúdo da Filosofia europeia.
Por estas e outras razões, os críticos opuseram-se existência de uma Filosofia africana. Contudo, não podemos desprezar Tempels, pois a sua abordagem tinha como fim o reconhecimento do negro como homem pelos colonizadores. Por conseguinte, os seus estudos contribuíram bastante para a redefinição do relacionamento entre o Ocidente e o povo negro.

Vamos recordar...
Etnofilosofia é uma corrente de pensamento que defende que as tradições africanas espelham a racionalidade do africano, podendo estas ser consideradas Filosofia africana (mitos, provérbios, etc.).

3.2.2. Filosofia profissional e critica à Etnofilosofia

Os críticos da Etnofilosofia defendem que não podemos confundir o emprego do termo «filosofia», usando-o no sentido ideológico. «Filosofia» é uma palavra que se utiliza para designar uma ciência rigorosamente científica. Reivindicar que os africanos têm a sua própria filosofia seria cair nas mãos dos colonizadores, que querem dar ou manter a ilusão de que os africanos têm uma filosofia, porque o que nós temos realmente são mitos, crenças e provérbios.
     Paulin Hountondji (Benin) é um dos grandes críticos e vale-se dos seguintes argumentos, expressos na obra African Philosophy, Mythe and Reality, de 1974.
  • 1. Reivindicando que existe uma Filosofia africana, estamos a cair na ratoeira colonialista e racista que insiste que um africano é diferente de um europeu. Portanto, qualquer referência à Filosofia africana obriga-nos a definir África em relação Europa. Logo, não podemos aceitar que haja uma Filosofia africana que claramente nega a Filosofia em geral.
  • 2. Filosofia, no seu sentido restrito, é uma disciplina científica, teorética e individual, assim como a Linguística, a Álgebra e, portanto, não se pode substitui-la por crenças populares, práticas tradicionais e comportamento popular de um povo qualquer. A Filosofia não se deve identificar com o mito ou com a religião tradicional.
  • 3. A Filosofia, enquanto disciplina científica, teorética e individual, emerge sempre em oposição ao mito, às religiões tradicionais e ao seu respectivo dogmatismo e conservadorismo.
O que é dogmático não pode ser filosófico. A relação filosófica com o mito e as religiões tradicionais não é uma relação arquivista ou arqueológica com função de sistematização e perpetuação, nem sequer é uma protectora desse passado popular, muito pelo contrário, a relação da Filosofia com mito e a religião tradicional é de continuidade, consciente e de critica continua da tradição do povo face aos desafios que o povo tem de enfrentar no presente e no futuro. Portanto, a Filosofia deve abrir os horizontes do povo para que este consiga enfrentar os desafios do futuro. Querer que a Filosofia africana exista não tem sentido.
  • 4. Todo o projecto de edificar uma Filosofia africana é um projecto europeu de demarcar a todo o custo a civilização africana da europeia. Por isso, dizer que os africanos têm a sua própria civilização quer dizer que a civilização africana é fixa e está mumificada nas tradições antigas, que todo o poder do africano reside no passado, nas tradições dos seus antepassados.
Os filósofos que encaram a Filosofia a partir do ponto de vista do passado designam-se por etnofilósofos e são europeus. Tentam sufocar a capacidade criativa dos africanos porque esperam que os filósofos africanos sejam simples ativistas das suas tradições culturais, em vez de pensadores originais.
  • 5. Todos concordamos que a Filosofia africana não pode nascer ex nihil (do nada), mas que necessariamente parte da herança cultural. Contudo, esta herança cultural não consiste apenas em olhar para atrás. A Filosofia africana deve ser urna confrontação criativa das suas ideias com o presente e o futuro.
  • 6. O papel criador da Filosofia africana tem de ser desempenhado por filósofos africanos que são sujeitos da actividade filosófica. A africanidade da Filosofia africana só emerge a partir de uma actividade filosófica de discussão e critica dos africanos que são filósofos. A africanidade consiste na pertença dos filósofos ao continente africano. A africanidade não consiste em falar da África ou em tratar de problemas africanos, pelo contrário, consiste na partilha e na conversa entre africanos que são filósofos qualificados e profissionais que usam a razão de maneira critica e criadora.
Hountondji afirma que o problema que se coloca é substancialmente a associação da ideia de filosofia palavra «africana», que a qualifica, deixando em dúvida se a palavra «filosofia» ainda mantém o seu significado original.
      Na opinião deste critico, a universalidade da Filosofia deve ser conservada. No entanto, isto não significa que a Filosofia deva tratar necessariamente os mesmos temas ou fazer as mesmas perguntas, até porque as diferenças de conteúdos são consideráveis.
      É preciso salientar que os primeiros propagandistas da Filosofia africana foram homens da Igreja, como, por exemplo: Tempels (belga), Alexis Kagame (ruandês), John Mbiti (queniano) e Vicente Mulago (congolês) Estes pensadores queriam somente encontrar bases psicológicas para implantar o Evangelho no terreno africano, sem prejudicar ninguém.
Fig.4: Paulin Hountondji

     Quando a palavra «filosofia» é qualificada pela palavra africana» não tem o mesmo significado que a Filosofia ocidental do século XIX.
      «Parece-me que uma palavra muda o seu significado se é aplicada à Europa e América em vez da -Africa. Este é um fenómeno comum, como o nosso amigo Odera (queniano) humoristicamente comenta: "o que é superstição é apresentado camo religião africana. Do Ocidente espera-se que diga que é mesmo assim, religião africana; o que é mito é apresentada pelos africanos como Filosofia africana, e os africanos estão 5 espera que os ocidentais confirmem que não é mito, mas Filosofia africana. O que é claramente ditadura é considerado democracia africana e espera-se que a cultura europeia apoie dizendo que é mesmo assim." Nós manipulamos as palavras em nome da cultura africana.
     O que é pseudo-desenvolvimento (desenvolvimento da elite, favoritismo) é descrito em Africa como desenvolvimento cultural e esperamos que o Ocidente aplauda tudo isto como desenvolvimento africano.» Portanto, segundo Hountondji, as palavras mudam de significado quando passam do contexto europeu para o contexto africano.

Vamos recordar...
Os filósofos Críticos da Etnofilosofia recusam-se aceitar a abordagem etnofilosófica Como sendo Filosofia africana porque, no seu entender, reforçaria a ideia da diferença entre africanos e europeus (forma inferior de fazer Filosofia).
A ideia de Filosofia africana deve ser aliada projecto de critica e reflexão de africanos sobre os problemas de África.

3.2.3. Filosofia política

Além das teorias das filosofias ocidentais que mencionamos na contextualização histórica (no ponto 3.1), os trabalhos forcados e a escravatura contribuíram sobremaneira para a redução do homem negro ao estatuto de coisa, de mercadoria susceptível de ser vendida e comprada, um simples instrumento de trabalho e fonte de rendimento das economias ocidentais.
       Assim, é obvio que a prioridade do negro seja a sua emancipação.
      Nas colónias da América do Norte, iniciou-se um movimento de revolta, manifesto pelos escravos através das chamadas work songs e posteriormente dos gospel spirituals, nas igrejas.
      A característica fundamental do africano é ser um guerreiro pela liberdade. As primeiras formas de luta do homem negro pela liberdade foram teorizadas por duas visões: a primeira acreditava que o negro só se emanciparia plenamente voltando sua terra natal (África); a Outra corrente defendia que o homem negro podia viver livre e em pé de igualdade com os brancos sem precisar de sair cia América. A primeira corrente foi defendida pelo jamaicano Marcus Garvey, discípulo de Booker Washington, e a segunda por William Edward Burghardt Du Bois.
   Encontramos doravante duas perspectivas, duas ideologias de libertação, cujas diferenças não serão somente ideológicas, mas também raciais. Du Bois era um jovem culto (cursara a Universidade, tendo sido o primeiro negro a fazer um curso superior). Marcus Garvey, conhecido como na extraordinary leader of men, não estudara muito, porém vira muitos negros a trabalhar em condições desumanas. f, importante salientar que Garvey começou a trabalhar aos 15 anos e foi expulso do seu serviço por incitar os seus colegas a protestar contra as condições injustas em que trabalhavam. Este julgava que os libertadores da raça negra deveriam ser negros autênticos e que o negro só se realizaria plenamente na sua terra natal, em Africa. Ora, Du Bois era mulato, por isso Garvey não o considerava negro, Na sua opinião, Du Bois não passava de um prolongamento da mão do branco, pois não concordava com o regresso dos negros à África-mãe. Garvey construiu um navio para levar os negros que quisessem voltar sua terra de origem.
     Du Bois, contrariamente ao seu antecessor Booker Washington, que achava que a emancipação do negro passava por uma formação técnica e por se acomodar posição subalterna do negro nos EUA, afirmou que o problema fundamental dos negros não era de ordem económica, mas antes política. Du Bois postulou a existência de elites intelectuais que serviriam de pontos de referência para os outros.
    A maior dificuldade que Du Bois teve de enfrentar foi levantar o moral do negro, freneticamente rebaixado pelas filosofias ocidentais. Este disse ao homem negro que Africa teve impérios: o império de Ghana, o império de Mwenemutapa, Benin, Mali, Shongai, etc., os quais deram um grande contributo para a humanidade.
      Paralelamente a Du Bois, e ainda sobre a mesma problemática, em Nations Negres et Culture, de Cheikh Anta Diop, lê-se: «Supomos, com a egiptologia moderna, que os egípcios eram de raça branca. Assim, teriam como conterrâneos gregos e romanos. Estes tiveram um espírito científico e filosófico idêntico ao da gente moderna do Ocidente [...]. No entanto, tudo indica que os egípcios eram de raça negra, como os etíopes e outros africanos, e que o Egipto civilizou o mundo Dados dos antigos escritores e são testemunhos oculares filósofos e da Bíblia que afirmam formalmente que os egípcios eram negros.»
      Outra evidência da influência africana sobre o Ocidente é a pintura: a pintura europeia revolucionou-se quando o pintor espanhol Pablo Picasso entrou num museu que ostentava objectos da cultura africana e ficou profundamente impressionado com uma máscara (assim nasceu o cubismo de Picasso).
       O africano era visto como o povo que nunca fizera nada de significativo. Os ocidentais (desconhecem ou negligenciam a célebre tese que coloca o negro africano num lugar privilegiado, considerando-o um dos «arquitetos» da Filosofia grega, que contou com sabedoria e a inteligência dos egípcios, cuja população não era apenas formada por homens de raça branca».
      Ao que tudo indica, o desprezo pelo negro e a sua consequente condenação a um plano o mais inferior passível foram deliberados, apoiando-se na literatura, o ocidente tentou distorcer tudo o que abonava a raça negra. Nos estudos de Maurice Delafosse, foi revelado que a época medieval africana era, sob muitos pontos de vista, comparável à época medieval europeia.
    Neste estudo dedicado história da África Ocidental, concluiu-se que a pretensa inferioridade intelectual do negro nunca tinha sido demonstrada e que havia provas que a contradiziam.
     Tudo isto prova que o Ocidente assumiu atitudes etnocêntricas, especialmente em relação ao continente africano e aos seus habitantes, como ficou demonstrado no julgamento do padre Bartolomeu de Las Casas, por defender a humanidade dos índios. O cardeal António chegou a aceitar que os índios eram homens, porém preveniu a Las Casas que estender esta humanidade aos negros seria um exagero.
     Este estudo revela tão-somente que a pretensa inferioridade do negro foi a arma psicológica que o branco inventou para denegrir a sua imagem, com o fim último de o dominar. Sendo assim, os intelectuais africanos tinham como missão procurar caminhos para a reconquista da humanidade perdida. Esta tarefa foi levada a cabo por várias correntes de pensamento, como o pan-africanismo, a negritude e o Black renaissance, entre outras.

Vamos recordar
  • A colonização dos africanos e a sua consequente escravização fez com que o povo negro fosse visto como um povo inferior.
  • Esta situação levou o homem negro a definir-se, desde cedo; como um guerreiro pela liberdade.
  • Vários intelectuais empenharam-se em investigar o passado histórico africano com o intuito de encontrar bases para fundamentar o seu valor:
  • Criaram-se movimentos, como o pan-africanismo e a negritude; que serviam como meio de união dos africanos no que se refere aos domínios político e cultural, respectivamente.

Pan-africanismo

O pan-africanismo surge como manifestação da solidariedade entre os africanos e os povos de descendência africana. O seu objectivo principal era a unidade política dos Estados africanos.
     A sua perspectiva englobava a federação dos países regionais autónomos e o seu enquadramento num conjunto de Estados Unidos de Africa. Dito de outra forma, o pan-africanismo lançou as bases da filosofia política africana, como vimos na unidade 2, no capítulo sobre a filosofia política africana.
      A primeira conferencia pan-africana teve lugar em Londres, em 1900. O seu objectivo era procurar uma forma de protecção contra os agressores imperialistas brancos e contra a política colonial que até então submetia os negros. Entendia-se que, por esta via, o africano conquistaria o direito sua própria terra, sua personalidade. Tratava-se, portanto, de uma luta pelo direito de todos os africanos serem tratados como homens, dai o conceito de pan-africanismo.

Renascimento Negro (Black Renaissance) e Renascimento Africano (African Renaissance)

      Foi dentro do espírito emergente de revolta contra o colonialismo que surgiu o Black Renaissance, cujo fundador foi Du Bois.
      Esta corrente do pensamento teve repercussões sociais, que consistiam em incutir no homem negro a ideia de ser igual aos brancos. Este movimento difundia ideologias contra a discriminação do povo negro. Defendia que os negros não podiam continuar a assistir passivamente sua própria discriminação e que deviam reagir perante os tratamentos desumanos. Du Bois afirmava: que os brancos saibam que por cada porrada que o branco der a um negro, nós lhes vamos dar duas; por um negro morto, nos vamos matar dois brancos.»
        Azikiwé escreve em Renascent Africa: «Ensinai o africano que renasce a ser homem.»
Foi no âmbito do renascimento africano que se desenvolveu o conceito de personalidade africana. A personalidade africana defende que existem características comuns, atributos essenciais e únicos que fazem parte do ser de todos os africanos. A ideia de «African Personality" teve as suas raízes em Edward Wilmont Blyden e foi retomada por Kwame Nkrumah.
    Blyden fundou a dignidade do africano na mesma linha do movimento negritude, procurando provar que a negra tinha uma história e uma cultura das quais se podia orgulhar.
       Blyden reflecte não sobre o passado do africano, mas sobre o que se deveria fazer em prol de um futuro africano mais digno. Para ele, cada um de nós tem um dever especial a cumprir, um trabalho não 56 importante, como também necessário, um trabalho a realizar pela maca a que pertencemos; lutar pela própria individualidade para a manter e desenvolver. «Orai e amai a vossa raça. Se não fordes vós mesmos, se abdicardes da vossa personalidade, não havereis deixado nada ao mundo, não tereis satisfação, utilidade, nada que atraia ou fascine os homens, porque com a supressão da vossa individualidade havereis perdido o vosso carácter distintivo. Vereis, então, que ter abdicado da vossa personalidade significará ter abdicado da missão e da glória particular à qual sois chamados» — aconselha Blyden, notando «Seria de facto renunciar à vossa divina individualidade, o que seria o pior dos suicídios».
       Este pensador demonstra que os costumes e as instituições da África negra estão em consonância com as necessidades dos africanos. Ademais, África pode dar um contributo ao mundo nas questões de ordem espiritual. A civilização europeia é dura, individualista, competitiva, materialista e foi fundada sobre o culto da ciência e da técnica. A civilização africana é doce e Humana.
       Para Nkrumah, o homem africano é um ser espiritual, dotado de dignidade, integridade e valor intrínseco.

3.2.4. Filosofia cultural (Negritude)

     A negritude insere-se no espírito pan-africanista da união e solidariedade entre os africanos, com a simples diferença de se revestir de um carácter cultural e literário. Tal como o pan-africanismo, a negritude nasceu fora do continente africano, como resultado dos esforços emancipatórios da comunidade negra radicada em França. Os mentores deste projecto eram membros de profissões liberais, estudantes, eclesiásticos, intelectuais e políticos.
      A negritude pretendia a união de todos os negros. Césaire, depois Senghor e, mais tarde, a revista Présence Atricaine e os congressos de escritores e artistas negros, que aquela organizou cm 1956 e 1959, dão expressão à ideia da unidade africana sob a forma cultural, O evolucionismo, classificando as sociedades segundo o seu grau de desenvolvimento técnico, confirmou a visão etnocêntrica da elite ocidental e facilitou o colonialismo. A maior parte dos evolucionistas, como Tylor e Morgan, e os etnocentristas, como, por exemplo, Levy Brhul, não admitiam a possibilidade de haver culturas que não fossem europeias. Estes consideravam a Vida cultural das outras sociedades como estádios arcaicos de um único processo cultural, no qual a Europa representava o estádio mais completo.
    O funcionalismo, por sua vez, sugerindo a irredutibilidade das culturas a um denominador comum, abria as portas ao princípio do relativismo cultural evocado pela etnologia americana. 
       A corrente relativista punha a tónica na diversidade cultural e social e considerava que a unidade do género humano se manifestava sua capacidade de se diferenciar em múltiplas culturas.
    A posição relativista pretendia sobretudo lutar contra Q imperialismo americano e defender as minorias colonizadas, os grupos africanos. Esta corrente impôs como normas o respeito pela diferença, a tolerância, a crença na pluralidade de valores e a aceitação da diversidade.
      Assim, abriam-se as portas para o pronunciamento da cultura africana, ou melhor, a negritude surge como resposta imediata ao espaço aberto pelo relativismo cultural.
       Entretanto, coube a Aimé Césaire o mérito de ser considerado o grande impulsionador deste termo. Aliás, a ele cabe a paternidade do termo e negritude, pois o seu conceito já se consegue distinguir no projecto anglófono do pan-africanismo.

Os maiores impulsionadores da negritude – Césaire (antilhano), Senghor (senegalês) e Damas (guianês) – resumiram o projecto em três conceitos:
  • Identidade – consiste em o negro assumir plenamente a sua condição;
  • Fidelidade – atitude que traduz a ligação do homem negro terra-mãe;
  • Solidariedade – sentimento que liga secretamente todos os irmãos negros.
A negritude era um movimento principalmente cultural e literário, mas com pretensões também políticas, conquanto protestava contra a atitude colonialista, lutando pela emancipação do povo.
     O poema de Noémia de Sousa «Let my people go/Deixe passar o meu povo» é disso um exemplo vivo.
    É útil reler os escritos de Senghor e sentir a nostalgia com que este lembra o seu passado recente: […] quando Césaire, Damas e eu próprio nos sentávamos ainda nos bancos do liceu […]» diziam…) nós, criadores da nova geração, queremos exprimir a nossa personalidade negra sem vergonha nem temor. Se isto, agrada aos brancos, ainda bem. Se não lhes agrada, não importa.
Fig.6: Aimée Césaire

E para amanhã que construímos os nossos templos, templos sólidos como nós sabemos edificar, e permanecemos erectos em cima da montanha, livres em nos mesmos».
No mundo da lusofonia, o movimento foi difundido por vários órgãos, como, por exemplo, a Junta de Defesa dos Direitos de África, a Tribunu de África e A Mensagem, formadas por africanos e europeus favorável promoção da cultura negro-africana.

Foi neste contexto que, em 1920, nasce, em Lisboa, a Liga Africana com os seguintes objectivos:
  • Promover, através de todas as mudanças políticas, o progresso físico, mental e económico da raça africana nas colónias portuguesas;
  • Conseguir a revogação de todas as leis e regulamentos de excepção contra os africanos ainda existentes na legislação colonial portuguesa, especialmente no que respeita ao direito de propriedade;
  • Conseguir que se torne realidade o livre acesso de indivíduos de raça africana a today as situações sociais e cargos públicos, nas mesmas condições exigidas aos indivíduos de raça branca.

Vamos recordar...
  • O pan-africanismo surge como manifestação da solidariedade entre os africanos e os povos da descendência africana.
  • O renascimento negro consistia em incutir no negro, que apenas soubera ser escravo, a ideia de que era igual ao branco (seu escravizador).
  • A negritude foi um movimento de união dos africanos do ponto de vista cultural.
  • As principais ideias apregoadas pela negritude foram: identidade, fidelidade e a solidariedade,
  • Na lusofonia, a negritude lutou pela revogação de todas as leis e regulamentos de excepção contra os africanos.

Bibliografia
GEQUE, Eduardo; BIRIATE, Manuel. Filosofia 12ª Classe – Pré-universitário. 1ª Edição. Longman Moçamique, Maputo, 2010.

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