As correntes do pensamento antropológico: o difusionismo (historicismo)

As correntes do pensamento antropológico: o difusionismo

O difusionismo, também conhecido por historicismo, opunha-se à corrente evolucionista partindo da ideia segundo a qual, na história da humanidade, as verdadeiras inovações são em número reduzido e propagam-se a partir de centros culturais, ou seja, sustenta que as inovações são iniciadas numa cultura específica, para só então serem difundidas de várias maneiras a partir desse ponto inicial. É evidente que existe a difusão cultural: o nosso alfabeto veio dos fenícios, os nossos algarismos são árabes, o cristianismo veio do Médio Oriente, etc.

A influência da escola difusionista foi, porém, efémera por causa dos exageros de alguns dos seus promotores, que faziam da difusão o factor único da evolução das sociedades. Os principais autores difusionistas são alemães ou austríacos (o padre Schmidt, 1868 – 1954; F. Graebner, 1877-1934; L. Frobenius, 1873 -1938), mas houve também um “hiperdifusionismo” inglês com G. Elliot-Smith (1871-1937) e o seu discípulo W. J. Perry.

Os difusionistas tinham tendência para ignorar o fenómeno de convergência que faz com que uma mesma instituição ou um mesmo traço cultural se encontre em civilizações diferentes, sem que haja uma origem comum. Por exemplo, em todos os sistemas económicos de auto-subsistência em que o parantesco é importante, o estatuto de um homem será menos avaliado pelo número e raridade de bens que possui, do que pelo número maior ou menor de parentes dedicados com que pode contar. Características importantes podem ser historicamente produzidas sem que se deva pensar numa origem comum. Se os Maias do Iucatão e os Hindus conheciam o zero, é claro que não houve difusão deste traço entre essas duas culturas.

Actualmente considera-se vã a procura das origens; no que respeita à história remota dos povos sem escrita, só se podem estabelecer algumas referências prudentes; e, sobretudo, um elemento de um sistema social é ininteligível quando extraído do conjunto que o contém e o explica.

Há historicamente três linhas de pensamento difusionistas a que chamaremos escolas:

a) O difusionismo inglês ou a escola inglesa: defende a difusão como sendo a única causa da expansão e dinâmica cultural, nega a teoria do paralelismo cultual exposta pelo evolucionismo e considera a existência apenas de um centro cultural (difusão heliocêntrica), desde o qual todos os traços culturais foram difundidos. Este centro cultural era o Egipto Antigo. Os principais proponentes dessa teoria foram Grafton Elliot Smith (1871-1937) e William James Perry (1887 -1949), ambos estudaram o Egipto Antigo intensamente, resultando na sua crença que o Egipto era o único centro cultural. As teorias destes pensadores passaram a ser designadas de pan-egiptismo

b) O difusionismo alemão ou escola alemã: os seus fundadores são Father Wilhelm Schmidt e Fritz Graebener, os quais defenderam a teoria dos círculos culturais de difusão que surgiram em determinados espaços e épocas e daí se difundiram. Estes teóricos acreditavam que o progresso da difusão seria a via mais eficiente para o avanço da civilização e advogavam a necessidade de fortalecer os contactos dos povos menos civilizados com os círculos culturais. O que em certo modo procurava legitimar a exploração colonial da Europa pelo mundo. O difusionismo é importante ainda hoje. O conceito de difusionismo explica como alguns traços culturais adquiridos e difundidos.

c) O difusionismo americano ou escola americana: considerou as culturas particulares como sendo o principal campo de estudo da Antropologia. Segundo Franz Boas, a cultura é tão complexa que não permite um levantamento histórico de carácter universal. A antropologia deve centrar os seus estudos em pequenas comunidades culturais, nomeadamente clãs, tribos, castas e outras formas primitivas de organização social. Acrescenta Boas que a difusão não é um processo linear e mecânico, mas pressupõe uma elaboração complexa por parte dos povos que apreende certos traços culturais. Considera que para a compreensão das culturas é importante o seu levantamento histórico, pois o facto de determinados traços culturais terem origem diversas condiciona a compreensão da cultura, ou seja, precisa-se conhecer a história de uma dada cultura para compreender a cultura em si.

Em síntese, o difusionismo ajuda a explicar a aculturação, mas não é a capaz de explicar todos os aspectos culturais como os primeiros difusionistas acreditavam. Existem exemplos de culturas em contactos próximos, mas que não partilham muitos traços. Por isso, o difusionismo aparece como uma corrente problemática por várias razões. Primeiro, é difícil demonstrar que uma inovação teve um ponto de partida único. Segundo, muitas invenções e ideias culturais podem ter sido descobertas ou ter evoluído isoladamente. Terceiro, as adaptações às necessidades humanas sociais podem facilmente ter tomado formas similares em diversas culturas, caso tenham sido as melhores soluções possíveis para problemas similares. Por exemplo, o aparecimento de pirâmides no Egipto e na América Central se é que, até hoje, nada tenha provado que a técnica de edificação de pirâmides se tenha difundido do Egipto à América Central, o mesmo se pode afirmar em relação ao fogo que já era utilizado pelos índios americanos e pelos africanos sem que estes povos tenham tido contacto algum no passado.

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