O Objecto da Psicologia de Aprendizagem

2. O Objecto da Psicologia de Aprendizagem

Já estudou as seguintes disciplinas da Psicologia: a Psicologia Geral, a Psicologia de Desenvolvimento. A Psicologia Geral deu-lhe uma explicação sobre as leis gerais da formação dos fenómenos psíquicos, suas manifestações e características e, por sua vez, a Psicologia de Desenvolvimento caracterizou o surgimento e as manifestações dos fenómenos psíquicos desde o nascimento até à idade adulta nas diferentes faixas etárias.

Pode-se dizer ainda que a Psicologia do desenvolvimento é o estudo científico das mudanças de comportamento relacionadas à idade durante a vida de uma pessoa. Este campo examina mudanças através de uma ampla variedade de tópicos, incluindo habilidades motoras, habilidades em solução de problemas, entendimento conceptual, aquisição de linguagem, entendimento da moral e formação da identidade.

Questões formuladas por psicólogos do desenvolvimento incluem as seguintes. São as crianças qualitativamente diferentes dos adultos ou eles simplesmente não têm a mesma experiência dos adultos? O desenvolvimento ocorre através de uma acumulação gradual de conhecimento ou por mudanças de um estágio de pensamento ou outro? As crianças nascem com conhecimento inato ou elas percebem as coisas com a experiência? O desenvolvimento é direccionado pelo contexto social ou por algo dentro da criança?

É chegado o momento de tratar de outra disciplina da Psicologia, a Psicologia de Aprendizagem.

2.1. A natureza da Aprendizagem e do Ensino

2.1.1. Aprendizagem

Segundo Netto (1978, p. 1) a aprendizagem e ensino são processos ligados entre si, como as duas faces de uma moeda. Correspondem às actividades fundamentais que ocorrem dentro das escolas, de modo sistemático, planeado, deliberado. A escola é um lugar onde as pessoas se reúnem para ensinar e aprender. As “lições para casa”, as fichas de leituras e as revisões das anotações de classe servem para prolongar essas actividades além do tempo e do espaço.

Durante a aula, o aluno exibe grande número de comportamentos ligados directamente à aprendizagem. Escuta, gesticula, fala, olha, escreve, lê, movimenta-se na turma, manipula objectos, executa operações. Internamente, o aluno que aprende recorre a múltiplos processos mentais: associa, compara, avalia, interpreta, classifica, estabelece hipóteses, compreende, imagina, julga, reflecte, memoriza, reconhece, recorda.

Woodworth e Schlsberg (1995) citados por Netto (1987, p. 1) realçam que “a aprendizagem não corresponde a um tipo específico de actividade. É uma mudança que ocorre no organismo, durante muitos tipos de actividades”. A aprendizagem é um processo interno e pessoal, que acontece dentro do aprendiz. Mas só as acções manifestas ou os comportamentos do aprendiz – o que este faz, diz ou produz – permitem a um observador externo concluir se houve ou não houve aprendizagem, na extensão e com a proficiência desejáveis.

De qualquer maneira, continua válida a afirmação de que aprender e ensinar definem os papéis essenciais desempenhados pelo aluno e pelo professor, respectivamente, na sala de aula. Sem essas actividades, a escola perde a razão de ser.

2.2. Educação

As definições convencionais de educação limitam-se à espécie humana. Educação caracteriza-se como um processo total por meio do qual o indivíduo, em interacção com a cultura em que vive, desenvolve sua compreensão da realidade e assimila conhecimentos, técnicas, crenças, atitudes e valores.

A educação originou-se do latim educatio, educationis. Entre os antigos romanos, educare – significa criar ou nutrir crianças e estava ligado a outro verbo,  educere – fazer sair, lançar ou tirar para fora, criar, amamentar.

A educação passa, assim, a ser concebida como um conjunto de experiências pessoais activas, dinâmicas, mutáveis, por meio das quais o indivíduo selecciona, absorve e incorpora informações, relaciona-as com as que já dispõe em seu repertório e as reorganiza, expressa ou utiliza para criar novas informações, orientar suas acções, agir junto a outras pessoas ou modificar o ambiente.

2.3. Instrução e Ensino

Instrução e ensino são muitas vezes empregados como sinónimos de educação. Embora seus significados se assemelhem sob diversos aspectos.

Educação, palavra mais abrangente, refere-se às múltiplas influências recebidas a partir do nascimento, que conduzem cada um de nós, de etapa em etapa, à autonomia e à plenitude do status adulto. Compreende todos aspectos do desenvolvimento individual – físicos, intelectuais e morais – e a socialização do indivíduo.

Instrução, termo mais limitado, designa a parte da educação que ocorre de modo intencional, sistemático e planeado. Envolve tanto a aprendizagem do aluno como o ensino pelo professor, ou por quem faz as vezes do mestre, como um livro didáctico, a televisão ou um computador. A instrução assenta-se em dois itens fundamentais: o estudante e um corpo de conhecimentos.

“a instrução é um esforço deliberado, cuidadosamente planeado, para produzir rsultados de aprendizagem cuidadosamente descritos. Instruir, portanto, significa organizar um conjunto de experiências variadas a fim de obter os resultados previstos” (Dale, 1972, p.4 citado por Netto, 1987, p.8).

Segundo Netto (1987, p. 8), Ensino é uma relação de ajuda ou de auxílio interpessoal, na qual alguém que dispõe de mais experiência e mais conhecimentos influencia outras pessoas de várias maneiras: lecciona, orienta, mostra, explica, demonstra, exemplifica, pergunta, responde, estimula, corrige, dirige debates, supervisiona, esclarece, prepara, propõe e acompanha umactividades, incentiva e guia quem aprende quanto ao uso adequado de materiais e recursos, facilita a compreensão e o desempenho adequados, fornece os preceitos ou fundamentos de uma ciência, técnica, arte ou habilidade.

O bom ensino requer planeamento, instrução, mediação do processo individual na aprendizagem e avaliação geral.

2.4. Conceito de Aprendizagem

Netto (1987, p.9) afirma que Psicólogos e educadores em geral reconhecem que a aprendizagem é um processo complexo. Envolve muitas variáveis que se combinam de diversos modos, e está sujeita à influência de factores internos e externos, individuais e sociais.

Aprender é palavra muito antiga. Na língua portuguesa falada durante a Idade Média, já significava fixar na mente ou na memória, conhecer.     

“Aprendizagem é uma mudança relativamente permanente no conhecimento ou no comportamento de uma pessoa, por causa da experiência” (Mayer, 1982, citado por Netto, 1987, p. 11).

Cabral e Nick (1997: 23) definem a aprendizagem do seguinte modo: Processo de transformação relativamente permanente do comportamento, em resultado do desempenho prático da experiência de certas tarefas específicas.

Trata-se de uma definição de aprendizagem no sentido mais amplo, que se pode aplicar tanto para a aprendizagem animal como para a aprendizagem humana. O animal aprende a deslocar-se, a alimentar-se, a proteger-se do perigo, a abrigar-se através da experiência directa através dos órgãos dos sentidos, para satisfazer as suas necessidades instintivas. Esta aprendizagem permite que os animais de cada espécie se adaptem ao meio ambiente. Os animais não podem aprender sobre a vida de outros animais que se encontram noutros continentes, pois falta-lhes a linguagem verbal para a aquisição de tal informação.

No sentido mais restrito, aplicável ao ser humano, a aprendizagem é o processo de aquisição de conhecimentos, hábitos, habilidades, aptidões e qualidades de carácter. Portanto, a aprendizagem permite ao ser humano adaptar-se ao ambiente e também modificar as suas condições de vida.

A aprendizagem animal e a aprendizagem humana caracterizam-se pela mudança do comportamento que resulta da experiência.

A aprendizagem realiza-se no relacionamento do indivíduo com outras pessoas na família, no grupo de coetâneos, no contacto com as pessoas da comunidade, nas creches, jardins infantis, na escola, nos locais de trabalho, nos grupos de tempo livre e associações. A escola é uma instituição onde a aprendizagem se realiza de forma planificada e sistemática.

2.5. Características psicológicas gerais da aprendizagem

Segundo Netto (1987, p. 12) a relação a seguir indica os aspectos geralmente incluídos nas concepções psicológicas da aprendizagem:

  • A aprendizagem abrange comportamentos tanto dos organismos humanos como dos animais;
  • A aprendizagem trata tanto do comportamento do sujeito médio ou estatístico como as diferenças individuais (aprendizes lentos, rápidos, etc.);
  • A aprendizagem envolve eventos muito diversificados, como a ocorrência de uma contracção muscular, a aquisição de um preconceito, a aquisição de um conceito abstracto, simbólico ou de uma regra gramatical, a aquisição de um sintoma neurótico e assim por diante;
  • A aprendizagem não se limita às respostas externas do organismo, que operam num ambiente particular, mas se relaciona, além disso, com grande número de distantes respostas internas do organismo e com reacções estritamente fisiológicas;
  • A aprendizagem não se limita à aquisição original de uma resposta aprendida, mas compreende também seu desaparecimento posterior (extinção), sua retenção após um intervalo de tempo (memória) e seu possível valor na aquisição de uma resposta nova ou diferente (transferência do treino);
  • A aprendizagem relaciona-se com operações e fenómenos diversos, como a motivação, a percepção, o desenvolvimento psicológico do organismo, a estrutura da personalidade, factores sociais e culturais e muitos outros.

2.6. Relação entre a Psicologia de Aprendizagem e a Aprendizagem

Tal como qualquer outra disciplina da Psicologia, a Psicologia de Aprendizagem estuda os fenómenos psíquicos nomeadamente, as sensações, as percepções, a imaginação, o pensamento, a linguagem, a memória, as imagens, os conceitos, as ideias, os motivos, os ideais, as emoções, os sentimentos, a vontade, a atenção, o temperamento, os hábitos, as habilidades e qualidades de carácter.

A especificidade da Psicologia de Aprendizagem reside, por um lado, no facto de estudar como é que os fenómenos psíquicos se formam no processo de ensino-aprendizagem e, por outro lado, de estudar os aspectos psicológicos do processo de ensino-aprendizagem.

A Psicologia de Aprendizagem estuda as condições psicológicas do processo de ensino-aprendizagem. A Psicologia de Aprendizagem vai estudar os tipos de objectivos educacionais, o que motiva para a aprendizagem, os aspectos cognitivos que intervêm no processo da aprendizagem, os aspectos psicológicos que devem ser considerados na avaliação dos discentes.

A Psicologia de Aprendizagem vai ajudar o professor na elaboração dos objectivos para as aulas, na selecção dos conteúdos, na escolha dos métodos e na elaboração dos diferentes tipos de avaliação.

Indique quatro razões que justificam a importância da Psicologia de Aprendizagem para a actividade do professor.

A Psicologia de Aprendizagem é importante para a actividade do professor, pois investiga a formação dos fenómenos psíquicos no processo de ensino-aprendizagem, permite conhecer os mecanismos psicológicos do processo de ensino-aprendizagem, considerar os aspectos motivacionais e os processos cognitivos no processo de ensino aprendizagem e fundamentar cientificamente a escolha dos objectivos, dos métodos e dos meios de ensino-aprendizagem.

Síntese

O tema nos permitiu compreender o conceito de aprendizagem humana como processo de aquisição de conhecimentos, habilidades, hábitos e aptidões e qualidades de comportamento diferenciando-a da aprendizagem animal, bem como caracterizar o objecto da Psicologia de Aprendizagem, o estudo de mecanismos psicológicos do processo de ensino-aprendizagem e da sua importância para a elaboração de objectivos das aulas, selecção de conteúdos, escolha de métodos de ensino-aprendizagem, elaboração de instrumentos de avaliação do processo de ensino-aprendizagem.

 

 

Bibliografia

BOCK, A.M.B et al. Psicologias: Uma Introdução ao Estudo de Psicologia. São Paulo, Editora Saraiva, 1993, p. 99.

MWAMWENDA, T. S. Psicologia Educacional, Uma Perspectiva Africana. Maputo, Texto Editores, 2005, pp.163-164.

NETTO, S.P. Psicologia da Aprendizagem e do Ensino. São Paulo, EPU, 1987, pp. 1-13.

RODRIGUES, A. & BILA, L. V. Módulo de Psicologia de Desenvolvimento e de Aprendizagem. Maputo. Universidade Pedagógica. S/d.



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