A Penetração Mercantil Europeia: A Penetração Mercantil Portuguesa

A Penetração Mercantil Europeia

Introdução

Nos finais do século XV, após cerca de cinco séculos de presença árabe em Moçambique, iniciou uma nova vaga de mercadores estrangeiros – os mercadores europeus, em particular, portugueses. Ao longo de quase quatro séculos os portugueses estiveram envolvidos no comércio de ouro com os shona do estado dos Mwenemutapa, de marfim com os marave e de escravos com as formações políticas do Vale do Zambeze e os reinos afro-islâmicos da Costa. Será, pois, em torno deste processo que iremos nos debruçar ao longo desta lição.

A Penetração Mercantil Portuguesa

O primeiro contacto entre os portugueses e as gentes de Moçambique data de 1498 com a chegada de Vasco da Gama, no âmbito da expansão europeia. Portanto não se tratou de uma acção premeditada que levou os portugueses a Moçambique, pois foi na busca do caminho marítimo para Índia que pararam casualmente no nosso país.

Nessa sua passagem por Moçambique, os portugueses testemunharam o intenso comércio de ouro que os árabes faziam com as populações de Moçambique, o que criou o interesse daqueles pelo referido comércio.

No início do século XVI, o interesse dos portugueses pelo comércio levou-os a iniciar o processo da sua fixação no território. Pelo que em 1505 fixam -se em Sofala e em 1507 na Ilha de Moçambique.

A fixação dos portugueses em Sofala e Ilha de Moçambique tinha por finalidade assegurar o controlo das rotas comerciais.

Esta fixação provocou tensão entre os árabes e os próprios portugueses pelo controlo do comércio, mas até finais do século XVI os árabes detêm a supremacia no comércio com os shona.

A reacção dos árabes à fixação portuguesa em Sofala e Ilha de Moçambique foi a abertura de uma nova rota comercial dos Mwenemutapa para Angoche, o que levou, em 1511, a um ataque português, mal sucedido, que não foi capaz de pôr termo às actividades árabes no sultanato, continuando a fazer comércio com os Mwenemutapa.

Até 1530 os mercadores portugueses tentaram, sem êxito, lutar, não só contra o bloqueio que lhes foi movido pelos árabes que transformaram Angoche num novo centro de escoamento de ouro, mas também contra o bloqueio de certas dinastias shona à passagem das mercadorias da costa para o interior. Só a partir desta data é que os portugueses decidiram penetrar no vale do Zambeze a fim de ir ao encontro das fontes de produção, construindo feitorias em Tete e Sena (1530) e Quelimane em 1544. Tratava-se, agora, não da tentativa de controlo das vias de escoamento de ouro, mas do acesso as zonas produtoras.

Neste período, inicial, a penetração portuguesa no interior tinha em vista montar um sistema de alianças com as classes dominantes locais, de forma a criar condições favoráveis da actuação do capital mercantil.

Numa primeira fase a aliança visava eliminar a concorrência dos mercadores árabes e conseguir o reconhecimento do capital mercantil português como único parceiro no comércio.

Mesmo após a resistência árabe ter sido neutralizada, a aliança com a aristocracia shona, se bem que tenha sido num contexto diferente, permaneceu uma necessidade estratégica.

Para atingir os seus objectivos, os portugueses adoptaram um sistema de alianças com a aristocracia shona, mas em finais do século XVI a aliança não era ainda suficiente para pôr em causa a autoridade do Mwenemutapa. Pelo contrário a aristocracia possuía uma margem de manobra e de iniciativa bastante lata daí que os agentes portugueses subordinam-se aos imperativos sociais e ideológicos dos Shona.

Os elementos fundamentais da supremacia shona sobre os mercadores estrangeiros manifestavam-se no pagamento da curva e da empata e na observância do ritual “descalçar, tirar o chapéu, estar desarmado e bater palmas para entrar na corte” em sinal de respeito ao rei.

Neste processo a ajuda militar concedida pelos portugueses ao Mwenemutapa parece ter desempenhado um papel de relevo face à insurreição interna liderada por Matuzianhe, que se fez cabeça de todos os levantamentos, intitulando-se rei de Makaranga.

O Mwenemutapa vendo que os seus inimigos se multiplicavam e não cessavam de o perseguir pediu apoio aos portugueses de Sena. Em 1607, e em troca de apoio militar para fazer face as revoltas internas, o mambo reinante, Gatsi Lucere, começa a ceder terras aos portugueses.

A cedência de Gatsi Lucere iniciou uma fase de aliança entre os shona e os portugueses. Entretanto nem todos os integrantes da corte eram favoráveis às concessões feitas aos portugueses. Assim quando Caprazine, da facção que se opunha aos interesses portugueses, subiu ao trono em 1627, tentou retirar os privilégios destes.

A posição do novo rei em relação aos portugueses levou a que este fosse, por estes, deposto e substiuído por uma pessoa mais disposta a preservar os interesses dos portugueses – Mavura.

Em 1629 Mavura foi baptizado com o nome de Dom Filipe e declarou-se vassalo de Portugal. Assinou um tratado que garantia aos portugueses a livre circulação de homens e mercadorias, que se achavam isentas de qualquer tributo; a obrigatoriedade de Mwenemutapa consultar o capitão português de Massapa antes de tomar qualquer decisão; a permissão para os mercadores entrarem na corte de Mwenemutapa sem respeitar o protocolo e a autorização para a construção de igrejas.

Mais ainda nos finais do século XVII uma guarnição de 50 soldados portugueses passou a residir no Zimbabwe do Mwenemutapa. Estavam deste modo estabelecidas formalmente as relações de dependência do Mwunemutapa para com os portugueses.

O Processo de Mineração

O trabalho de mineração era geralmente organizado no quadro das relações de parentesco e da divisão das tarefas no decorrer do processo produtivo fazia-se de acordo com esse quadro. Eram sobretudo mulheres e crianças que trabalhavam nas minas ou, pelo menos, cabiam-lhes as tarefas mais duras e perigosas, nomeadamente a de penetrar nas escuras galerias à procura de ouro. O trabalho nas minas provocou a fuga de comunidades inteiras, particularmente nas áreas mineiras.

Entretanto, o capital mercantil, apesar dos aluimentos e das fugas de comunidades, submetia cada vez mais a produção ao valor de troca, numa sociedade em que antes predominara a produção de valores de uso.

Portanto as pessoas passaram a ser obrigadas a dedicar mais tempo a mineração em prejuízo das actividades viradas para a subsistência.

Impacto da Penetração Mercantil Portuguesa

Como viu, caro aluno, com a penetração mercantil portuguesa a mineração passou a ser feita em prejuízo da agricultura e outras actividades de subsistência contribuindo para a erosão da economia natural das mushas;

Outra consequência do comércio do ouro é que ele despoletou lutas clânicas pelo controle do comércio com os portugueses, visto tratar-se de uma fonte de obtenção de bens de prestígio. As distensões internas que culminaram com a aliança dos Mwenemutapa aos portugueses, iniciando a desintegração do estado tinham como principal motivação o controle do comércio do ouro.

A penetração mercantil portuguesa levou também ao surgimento de novas unidades políticas cuja classe dominante era formada por mercadores portugueses estabelecidos como proprietários de terras, que haviam sido doadas, compradas ou conquistadas (PRAZOS).

A Rebelião de Changamire Dombo em 1693

Em 1693, como resultado do descontentamento que se instalou no estado perante o novo quadro criado pelo acordo de 1629, Changamire Dombo, a convite do mwenemutapa Nhacunimbite encabeçou um levante armado que levou a derrota dos portugueses e sua expulsão do estado. Com estes acontecimentos terminava a fase do ouro e iniciava a do marfim.

Paralelamente, a dinastia dos Changamire impôs o seu poder alargando, territorialmente, o estado e substituindo a velha dinastia dos Mwenemutapa. O novo Mambo colocado no poder ficou proibido de reatar as relações comerciais com os portugueses. Marcando-se desta forma o fim do ciclo do ouro.

Referências bibliográficas

MINEDH. Módulo 6 de História: Os estados em Moçambique e a Penetração Mercantil Estrangeira. Instituto De Educação Aberta e à Distância (IEDA), Moçambique, s/d.

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