Os Prazos da Coroa: Estrutura dos Prazos, Tentativas de Regulamentação do Sistema de Prazos e a Decadência dos Prazos
Os Prazos da Coroa
A
palavra prazo, foi usada a partir do séc XIV para designar pequenas unidades
políticas estruturadas dentro do império dos Mwenemutapa por mercadores de
origem portuguesa e indiana. A ocupação das terras seguiu três vias principais:
- Doações dos chefes africanos ao governo português;
- Conquista militar por parte de alguns mercadores ricos e;
- Compra aos chefes africanos pelos mercadores.
O
sistema de prazos existiu apenas na região do Zambeze, entre Tete e Sofala nos
séc. XVI e XVII.
Por quê os Prazos
A
razão que levou Portugal a criar os prazos foi o facto de aqueles que eram exilados
para Moçambique, tal como as autoridades administrativas e os soldados enviados
para lutar contra o mwenemutapa, se apoderarem de grandes terras onde exerciam
o seu poder absoluto sem prestar contas a ninguém. Desta situação, que não
convinha ao rei de portugal, pois perdia benefícios económicos e políticos,
nasceu a ideia de mandar contingentes de pessoas a Moçambique, a quem concediam
uma parcela de terreno uma medida que vinha acelerar a dominação colonial com o
incremento do povoamento branco.
O
concessionário era obrigado a residir no prazo, a pagar um foro e a fornecer
tropas as autoridades portuguesa em caso de necessidade. A terra era concedida
por um período de duas a três vidas findo o qual, a terra voltava à coroa,
podendo continuar na mesma familia, em novo prazo de três vidas com novo foro,
se tivesse sido convenientemente administrada.
A
sucessão era feita por linhagem feminina e os herdeiros eram obrigados a casar
com brancos ou seus descendentes.
O
que de princípio se pretendeu criar, quer em Moçambique quer na Índia foi a
exigência de renovação das concessões de três em três gerações com a sucessão
se fazendo por via feminina em caso de morte dos titulares.
Este
esquema enquadrava-se na perspectiva de levar a Moçambique mulheres portuguesas
de modo a garantir a continuidade da raça branca, evitando casamentos entre
homens brancos e mulheres negras.
Desde
o seu surgimento, os prazos, enfrentaram uma série de dificuldades, pelas
seguintes razões:
- Muitos dos prazeiros eram cadastrados; em Moçambique estavam cumprindo penas de degredo e como tal não representavam os interesses da coroa portuguesa em Moçambique;
- Pouco numerosos, os prazeiros não podiam cumprir a missão de promover a cultura europeia em Moçambique, pelo contrário acabaram eles por se africanizar;
- A autoridade portuguesa estabelecida na costa era impotente para impor a lei aos prazeiros cujo poder militar crescia continuamente;
- Muitas terras tinham sido ocupadas com esforço individual dos prazeiros e sem qualquer apoio da coroa portuguesa;
- A autonomia dos prazos era quase absoluta.
Deste
quadro resultou que, se bem que inicialmente se tenha conseguido um êxito
parcial, com o passar do tempo os prazos evoluiram numa direcção totalmente
diferente da prevista, funcionando exclusivamente em benefício dos próprios
prazeiros no lugar de se guiar pelos interesses da monarquia portuguesa. Os
prazeiros foram assim aumentando os seus benefícios pessoais, o seu poder
político-militar nas suas terras e estabelecendo-se o mais possível de modo a
fazer frente tanto aos ataques dos chefes locais, como das próprias autoridades
portuguesas.
Estrutura dos Prazos
A
estrutura do prazo era bastante simples. No topo encontrava-se o senhor
prazeiro, dono e senhor do prazo. Era responsável pela fixação dos impostos a
ser pagos pela população do prazo e arredores, pela justiça no prazo, possuia
os seus exércitos.
O
senhor prazeiro era servido por uma enorme massa de escravos divididos em dois
grupos:
- 1. A-chicunda - com a função de garantir a defesa do prazo, organizar operações de caça ao escravo nas formações vizinhas, cobrar impostos, etc;
- 2. Escravos domésticos - afectos a agricultura, mineração e a indústria ligeira local.
A
economia do prazo estava baseada em acções de pilhagem conduzidas contra
territórios vizinhos, bem como, no comércio de escravos, peles e marfim.
Tentativas de Regulamentação do Sistema
de Prazos
O
quadro descrito sugere que os prazos desde o seu surgimento não responderam aos
anseios da coroa portuguesa e como tal o governo enceta acções convista a
disciplinar e exercer um controlo sobre a actividade dos prazeiros, tendo para
o efeito publicado leis visando reformar o sistema.
A
primeira reforma foi publicada em 1667 mas os seus resultados foram praticamente
nulos, pois os prazeiros continuaram a não pagar os foros à coroa portuguesa e
a administrar os prazos como bem entendiam.
A
segunda tentativa de regular os prazos ocorreu em 1760 quando o governo
português decidiu que:
- Os prazos não deviam ter mais de 3 ou 4 léguas quadradas e caso fossem atravessados por um rio ou possuissem um terreno mineiro não deveriam exceder a 1 légua;
- A partir de então os prazos só deveriam ser autorizados pelo governo de Lisboa depois de um período experimental de quatro anos;
- Os prazeiros deveriam permitir a fixação de outros europeus dentro dos seus terrenos;
- Os prazeiros deveriam contribuir na manutenção dos fortes, na construção de estradas e travessias de pontes e contribuir em homens e armamento para as expedições militares.
Apesar
da publicação deste rigoroso regulamento os prazeiros continuaram relutantes em
aceder a qualquer das exigências portuguesas.
Decadência dos Prazos
Na
primeira metade do século XIX os prazos entraram numa fase de regressão na qual
ocorreu o desaparecimento de muitos prazos, motivado por factores internos aos
próprios prazos bem como a factores externos que se juntaram aos primeiros.
Entre esses factores há a destacar o comércio de escravos, encetado em grande
escala na 2a metade do século XVIII no vale do Zambeze e, a partir de 1830, os
ataques dos Nguni do estado de Gaza.
Com
o desenvolvimento do tráfico de escravos, os prazeiros exportavam os
camponeses, de quem dependia a produção de víveres, e mais tarde, com o aumento
das exigências em escravos acompanhado do esgotamento dos primeiros, começaram
a exportar os a-chicunda cuja função principal consistia em proteger
militarmente os prazos e em depredar as sociedades vizinhas.
Como
consequência, os cativos em fuga, organizaram bandos predatórios que atacavam
os prazos e destruiam as redes comerciais do sentão.
A
situação agravou-se quando forças militares Nguni, começaram a efectuar
"raids" à Sena, Manica Bárué e Luabo, capturando camponeses, apoderando-se
de mulheres, queimando povoações, cobrando tributos.
Esses
dois fenómenos suscitaram um extenso despovoamento em todo o vale o que, a
partir de 1830 a maioria dos prazos se tornou vulnerável às invasões de
chefaturas e de estados que os senhores de terras tanto tinham sacrificados ao
comércio de escravos desde 1750.
Assim,
forças do Bárue, começaram a atacar regularmente vários prazos em busca de
alimento.
Entre
1820 e 1835, o exército do muenemutapa reinante atacou alguns prazos situados
na margem esquerda do Zambeze.
Entretanto,
por volta de 1840 os Nguni de Gaza tinham ocupado 28 dos então existentes 46
prazos. Nos prazos não afectados pelos ataques, os seus arrendatários foram
obrigados a pagar tributos periódicos aos guerreiros Nguni. De cobradores
impiedosos do "mussoco" os senhores de prazos tinham-se tornado seus
pagadores.
Este
fracasso deveu-se também a duas razões fundamentais:
- Os portugueses agiram mais pela necessidade de controlar uma situação do que dentro de um plano de colonização bem elaborado.
- A resistência a este sistema foi sempre muito grande.
Referências
bibliográficas
MINEDH. Módulo 6 de História: Os estados em Moçambique e a Penetração Mercantil Estrangeira. Instituto De Educação Aberta e à Distância (IEDA), Moçambique, s/d.
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