Actividade pecuária

2.6. Actividade pecuária

pecuária é a arte ou o conjunto de processos técnicos usados na domesticação e criação de animais com objectivos económicos. Assim, a pecuária é uma parte especifica da agropecuária.

Tal como já foi anteriormente referido, etimologicamente, a palavra pecuária provém do latim, pecus quer dizer cabeça de gado. Esta palavra tem a mesma raiz latina de pecúnia que significa (moeda, dinheiro). De facto, na Roma Antiga, os animais criados para o abate eram também usados como reserva de valor económico. As primeiras moedas romanas ostentavam também as imagens de animais (ovelhas e outros) as quais chamaram pecúnia, do radical latino pecus.

A criação de gado é urna das mais velhas actividades conhecidas. A título elucidativo, a pecuária é citada na Bíblia como a primeira tarefa dada por Deus a Adão: tal tarefa consistiu em nomear e cuidar do Jardim do Éden e dos animais (Génesis). Estudos têm também demonstrado que a domesticação de animais e a sua criação, é uma prática anterior à agricultura ou feita ao mesmo tempo, e resultou do aperfeiçoamento do trabalho dos caçadores-recolectores, que povoaram a terra há cerca de 100 000 anos atrás, que inicialmente aprenderam a aprisionar animais para guardá-los vivos para o abate e depois perceberam a possibilidade de poder reproduzi-los. Nos primeiros estágios da pecuária, o Homem continuava nómada e na maioria dos casos conduzia o seu rebanho domesticando, nas suas deslocações, não procurando caçar, procurando sim novos locais para alimentar o seu gado. Há evidências da agricultura ter sido praticada somente a partir de 8000 a. C., mas que os seus efeitos foram significativos sobre a pecuária, já que a agricultura acabou fixando o Homem nos locais de plantio, e, portanto, novas soluções para a pecuária tiveram de ser implementadas.

Factores de desenvolvimento da pecuária e sua localização

Os factores que mais contribuem para o desenvolvimento, localização e modernização da pecuária são os seguintes:

FACTORES NATURAIS

Analogamente ao que acontece com a agricultura, a pecuária depende das condições naturais, nomeadamente, o clima e os solos. Por exemplo, as precipitações, regulares e pouco intensas, e a suavidade do clima permitem a existência de pradarias permanentes onde o gado pode pastar livremente durante todo o ano. Estas condições naturais são especialmente adequadas para o desenvolvimento do gado, nas diversas regiões do globo. Nas regiões tropicais, quentes e húmidas, numerosos parasitas e as doenças existentes são responsáveis pela redução dos efectivos populacionais.

Por isso a pecuária tem aí pouca importância. Os climas quentes e secos (savanas e desertos), são zonas com ambientes pouco acolhedores para os animais. Porém, prospera a criação de gado pouco exigente na alimentação (carneiros, ovelhas, cabras e camelos). Nas regiões árticas, muito frias, portanto, criam-se renas, que são a base da alimentação dos povos, uma vez que fornecem carne, leite e peles para o fabrico de tendas. Nas regiões temperadas, a suavidade das temperaturas e a abundância relativa das chuvas favorece o desenvolvimento das pastagens. Estas condições tornam favoráveis o desenvolvimento dos pastos, sobretudo para o gado bovino que exige clima ameno e pastagens sempre frescas.

O gado depende igualmente da vegetação, isto é, a natureza do upo de pastos (amargo, doce e misto). A major densidade de vegetação impede a mobilidade espacial do gado, contrariamente às regiões com menor densidade.

FACTORES SOCIOECONÓMICOS

Os factores sociais e económicos condicionantes da criação do gado são:
  • O aumento gradual de consumo nos centros urbanos e a difusão dos produtos animais tanto nas cidades como nas zonas rurais, incentivando assim a pecuária como actividade económica;
  • O desenvolvimento dos meios de transporte e a difusão dos matadouros, frigoríficos e indústrias de conservas alimentícias;
  • A modernização dos processos de frigorificação e de conservação da carne e do leite; 
  • Desenvolvimento da zootecnia, ciência ligada ao aprimoramento dos animais úteis.
Outro motivo que condiciona a criação do gado é a religião. Determinados povos são por natureza pastores, enquanto outros não podem ou não querem por razões religiosas. Por exemplo, a Índia, apesar de ter o maior número de cabeças de gado bovino do mundo, não se serve delas pois a religião hindu proíbe o seu abate, fornecendo apenas o estrume, leite e força de trabalho. Por outro lado, entre os islâmicos não se criam suínos, pois a religião impede-o.

Tipos de pecuária

Já foi referido atrás que a pecuária é a actividade económica que consiste na criação de animais e na sua reprodução com a finalidade económica. Se se analisar as formas e técnicas empregues pelo Homem na criação de animais, assim como os recursos que os vários povos obtém de seus rebanhos, a pecuária pode ser classificada em vários tipos ou sistemas de criação, conforme a maior ou menor intensidade com que é feita. Assim, vários são os tipos ou sistemas de criação dominantes nos diversos locais do globo, e podem subdividir-se nos seguintes grandes grupos:
  • Sistema ultra-extensivo em campo aberto;
  • Sistema extensivo em cercados;
  • Sistema extensivo;
  • Sistema semi-intensivo;
  • Sistema intensivo.
Todavia, isto não impede que se encontrem outros Sistemas intermediários entre os acima referenciados.

Sistema ultra-extensivo em campo aberto — segundo Andrade (1998), é típico de áreas subpovoadas e de pastagens pobres. Nelas, o gado tem grande facilidade em se adaptar ao meio, geralmente hostil, e dá baixo rendimento. É o sistema associado aos casos de nomadismo pastoril em que o pastor vive em tendas facilmente desmontáveis e acompanha, com a família e seus pertences, os animais que constantemente se deslocam. Estes casos de nomadismo acontecem com as comunidades de lapões da região árctica (Lapónia, Finlândia) que acompanham rebanhos de renas da tundra taiga e vice-versa, conforme a mudança das estações do ano. No deserto do Saara estão os tuaregues, grandes criadores de cabras e camelos, no Médio Oriente, os beduínos, que são grandes criadores de carneiros e os mongóis da Asia central, que são grandes criadores de cavalos. Os povos nómadas alimentam-se de leite, seus derivados (coalhada, manteiga) e carne. Nos seus deslocamentos, os nómadas estabelecem contactos com populações sedentárias de agricultores, com os quais trocam produtos.

Numa fase mais evoluída, temos os exemplos de criadores que fazem migrações sazonais, quando os rebanhos se deslocam de regiões secas, onde passam a estação chuvosa, para regiões húmidas no estio, onde se alimentam de restos de culturas e pastagens naturais. Como exemplos, temos os casos da transumância de ovinos da zona mediterrânica, isto C, do Sul da Europa e do Norte de Africa. No verão estes rebanhos deslocam-se para as pastagens das montanhas e quando chega o Inverno, deslocam-se para a planície. Este deslocamento decorre do facto de que no Verão a planície é atingida pela seca, os pastos são escassos e nas montanhas há pastagens.

No Inverno, as montanhas são frias e cai neve, encobrindo as ervas.
Na transumância, apenas os pastores se deslocam com o rebanho. As famílias ficam nas suas casas, dedicando-se à pequena agricultura. É diferente, portanto, do nomadismo pastoral, onde todos acompanham o rebanho.

Sistema extensivo em cercados — neste tipo de sistema, o proprietário procura fazer grandes investimentos por forma a extrair maior rendimentos. Desse modo, se a propriedade for cercada, unicamente os animais de sua propriedade utilizam a pastagem, podendo fazer um rodízio do seu uso, substituindo alternadamente os cercados, por forma a que disponham de alimentos durante todo o ano. O criador pode fazer a selecção das raças do rebanho, através da introdução de novos reprodutores, controlando a lotação — quantidades de animais por hectare de pastagem, a fim que esta não exceda a capacidade de carga dos seus cercados. Em caso de suprimento alimentar em determinados períodos do ano, torna-se mais fácil fornecer suplemento alimentar ao rebanho constituído por restolhos de plantações, ou concentrados destes (torta de semente de algodão, de bagaço ou farelo de trigo).

Sistema extensivo — a pecuária extensiva é realizada em grandes áreas ou propriedades, sem utilização de técnicas de criação; o gado fica solto e a pastagem é natural. Não há utilização de fertilizantes para regenerar o solo, o que faz com que os rendimentos sejam muito baixos. Apesar disso constitui a maior reserva de carne para o mundo. O número de cabeças de gado por hectare é reduzido. A pecuária extensiva é comum em países de grande extensão territorial, como por exemplo, a Argentina, Austrália, Brasil, Estados Unidos, México e República da Africa do Sul.

Destaca-se a criação de bois e de ovelhas nesse tipo e está virada basicamente para a produção de carne, lã e couro. O leite não é aproveitado de forma integral, devido falta de uma rede de transporte adequada para a sua distribuição. As crias e parte do rebanho são vendidas no início da estação seca, quando os pastos começam a tornar-se escassos.

Sistema semi-intensivo — neste sistema, o Homem realiza uma agricultura ao da pecuária com vista a aumentar a capacidade de lotação da área disponível e fornecer alimentos que permitam ao rebanho um desenvolvimento mais rápido. Conforme as condições climáticas e edáficas, procuram-se desenvolver culturas gramíneas — sorgo, sempre-verde, elefante, entre leguminosas, como por exemplo a alfafa e cactáceas. No Sul do Peru, áreas de deserto, conquistadas pela irrigação, são utilizadas para a cultura da alfafa, visando a criação de gado leiteiro de raça holandesa. Nos sistemas semi-intensivos, a parte sanitária tem já uma importância crucial já que existem vacinações para as mais diversas epizootias.

Sistemas intensivos — a pecuária intensiva consiste num tipo de criação de gado com aplicação de técnicas desenvolvidas ou aperfeiçoadas e grande emprego de capital. O gado passa grande parte do tempo em espaços reduzidos (nos estábulos) e beneficia de bons cuidados médicos e alimentação adequada. É essencialmente comercial e visa a produção em larga escala de leite e carne de corte. O gado, quando leiteiro, vive mais tempo no estábulo que nos pastos, pastando em áreas limitadas durante um número determinado de horas por dia. Quando é gado de engorda, fica em regime de confinamento, por forma a que, sendo impedido de caminhar, se evite que despenda energias e engorde no menor tempo possível.

Faz-se a selecção de raças para melhorar a qualidade do rebanho. O número de animais por hectare é grande. Assim, nas áreas de pecuária intensiva, instalam-se indústrias de lacticínios.

Em certos países, como na Holanda e Israel, têm sido obtidos resultados fabulosos na produção de leite por vaca/ano, como resultado do aumento do período de lactação de cada animal. Há igualmente exemplos de utilização de condicionamento de ar para que vacas holandesas criadas em ambientes tropicais não percam a sua capacidade de reprodução.

A pecuária intensiva localiza-se próximo dos grandes centros consumidores. É o caso da pecuária de gado leiteiro do nordeste dos EUA que abastece os grandes centros urbanos, como New York e outros. Cerca de 20% do leite produzido no pais é fornecido por essa área. Em muitos locais da superfície da Terra, a criação de gado está associada agricultura. Tal tipo predomina em quase toda a Europa (Alemanha, Países Baixos, Dinamarca, Escandinávia, Reino Unido e França), Ásia, parte Nordeste dos EUA e Nova Zelândia.

A particularidade da pecuária de gado leiteiro em relação ao sistema intensivo é que o período de deficit dos pastos é compensado pela produção de forragens, o que permite completar a alimentação do gado nos períodos de frio mais intenso. As precipitações regulares e pouco intensas, e a suavidade do clima permitem a existência de pradarias permanentes onde o gado pode pastar ao ar livre e em grande parte do ano. Essas condições naturais são especialmente adequadas para o desenvolvimento do gado bovino leiteiro. Com essa forma de pecuária são obtidos altos rendimentos, devido à utilização de técnicas mais modernas de criação e selecção do gado.

Os tipos de gado e principais países de criação

Tipos de gado
Os tipos de gado mais utilizados pelo Homem e que atendem às necessidades, principalmente alimentares, mas também de força de tracção, de meio de transporte e de matéria-prima para a indústria têxtil, de curtume e de confecção de calçado, são: bovino (relativo ao boi); equino (relativo ao cavalo); ovino (relativo as ovelhas); bubalino (relativo ao búfalo); suíno (relativo aos porcos; porcino); caprino (relativo às cabras ou bode); asinino (relativo ao asno, burro, jumento ou jegue).

Gado bovino
É o mais utilizado pelo Homem como fonte de alimento e matérias-primas. A pecuária bovina constitui uma actividade bastante difundida no mundo e a carne é bastante comercializada.
Muito países destacam-se na sua exportação. são os casos da China, Estados Unidos, Argentina, Austrália, entre outros. Os países importadores são principalmente os da Europa Ocidental.
   A produção de carne nesses países não é suficiente para atender às suas necessidades; logo dependem da importação.

A Índia possui o maior rebanho de gado bovino (cerca de 190 milhões de cabeças). Contudo, não é cabalmente aproveitado para a alimentação, pois considera-se o consumo de carne como um sacrilégio, pois o boi é adorado como um animal sagrado. Os indianos utilizam o leite, o couro e a força dos animais nos diferentes trabalhos. Além do gado bovino, a Índia possui grandes rebanhos de búfalos, cabras e carneiros.

Depois da Índia, o Brasil, a China, os EUA, a Argentina e a Austrália, entre outros possuem os maiores rebanhos do mundo. Entretanto, os EUA demonstraram uma franca recuperação dos seus efectivos e produção, afectada em 2004 pela das vacas loucas, e são agora os maiores produtores globais de carne bovina. Esse facto deve-se à elevada taxa de desfrute nesse pais, de 36% em 2006, que é influenciada por diversos factores, tais como a espécie de gado, a forma de criação (confinamento), a utilização de hormonas de crescimento e a qualidade da alimentação.
Fig.30: Valores absolutos nos principais países produtores. [Fonte: Agri Benchmark Beef Report (2007).]
 
A nível internacional, o Brasil é considerado o pais com o maior número de efectivos bovinos do mundo. Do total de cabeças, em alguns países, grande percentagem é de vacas, para produção do leite e carne. No cenário internacional, os grandes players do mercado de carne bovina em termos de maior produção são os EUA e o Brasil, seguidos pela China, Argentina e Austrália, tal como ilustra a tabela acima. Entretanto, os principais exportadores deste tipo de carne são o Brasil e Austrália, seguidos pelo Canadá.

Gado ovino e caprino
Comparativamente ao bovino, este é menos exigente em termos de pasto. É geralmente encontrado em zonas de solo pedregoso e clima pouco húmido e frio. Relativamente aos ovinos e caprinos, a Ásia detém o maior rebanho do mundo, seguido da África e da Oceânia (na sua totalidade constituída por ovinos e com predominância absoluta para a Austrália), estepes da Austrália, e estepes do planalto da Patagónia, na Argentina. Este tipo de gado fornece lã para a indústria e é tosquiado uma vez por ano.
A criação de ovinos em áreas húmidas destina-se principalmente ao fornecimento de carne.

Gado suíno
O gado suíno é o mais fecundo (uma porca produz cerca de 10 crias por ano). Assim, a pecuária suína é a mais rentável. A Europa possui o major rebanho de suínos, destacando-se a Polónia, França e Hungria. Contudo, entre os países do mundo, é a China que possui o maior número de suínos (mais de 60 milhões de cabeças), seguida dos EUA. Nos EUA e outros países, a criação de suínos está associada plantação de milho, pois este serve-lhe de alimento.

Outros tipos de gado
Os equinos são de grande valor para muitos povos. Parece terem surgido nas regiões de estepes, onde foram, e continuam a ser, um importante meio de transporte para o Homem. Mesmo em regiões desérticas, a sua importância é grande, representando para certos povos nómadas uma situação de prestígio. As maiores manadas encontram-se no Brasil e EUA.

Os búfalos (gado bubalino) são de origem asiática (Ásia do Sudeste). Foram introduzidos em várias áreas do mundo, e com sucesso. Trata-se de um animal resistente que se adaptou às regiões quentes. É comum no Brasil e Europa mediterrânica.

A pecuária moderna

A pecuária tem como objectivo principal produzir produtos alimentares em massa para abastecer o mercado interno e externo. Segundo Antunes (1995), nos países desenvolvidos (Europa, América do Norte, Austrália, Nova Zelândia e Japão) a pecuária tornou-se uma actividade industrial, com carácter científico. A criteriosa selecção de raças de mais rápido crescimento, maior produção de leite e alimentação racional proporcionam a obtenção de elevados rendimentos. Os estábulos são muitas vezes autênticas salas climatizadas, onde a distribuição de água e alimentos e a ordenha São mecanizadas e automatizadas.

por sua vez, os aviários, onde a Luz, a temperatura e a humidade são automaticamente controladas, constituem verdadeiras fábricas de ovos e carne. Com vista a urna rápida e fácil reprodução, pratica-se a inseminação artificial. por outro lado, as eficiências dos serviços veterinários diminuem grandemente as doenças que, num passado recente, dizimavam o gado. Igualmente nos matadouros, os animais abatidos são sujeitos a análises para se detectar qualquer doença que a revelar-se é imediatamente objecto de medidas para eliminá-la e assim evitar-se a sua propagação. Na Argentina e no Brasil, a pecuária tem estado a apresentar grandes sinais de desenvolvimento, sendo estes alguns dos países na lista dos grandes exportadores mundiais de carne de bovino.


Bibliografia
MANSO, Francisco Jorge; VICTOR, Ringo. Geografia 12ª Classe – Pré-universitário. 1ª Edição. Longman Moçambique, Maputo, 2010.

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