Os territórios belgas

Os territórios belgas

O Congo durante o período colonial

A história do Congo belga desde a Segunda Guerra Mundial é a história de uma descolonização há longo tempo falhada.

A política colonial belga fez do Congo uma colónia mais avançada do que muitas outras quanto a certos aspectos. O Congo era considerado, mais ou menos, uma «propriedade de família», em cujas zonas mais salubres os europeus podiam instalar-se e criar raízes. Como resultado dessa política, em 1960, existia um número bastante considerável de colonos belgas.

A nível da economia, o país tinha iniciado um desenvolvimento industrial raro em África, graças à acção vigorosa de sociedades financeiras, das quais se destacavam as seguintes: 
  • A Unilever - que desenvolvia as suas actividades nas zonas florestais e no Kivu.
  • A Forminiére - com concessões no Kassai.
  • A Société Générale de Belgique - que actuava no Baixo Congo.
  • A Union Miniére du Haut-Katanga - com concessões na região do Katanga.
Graças à acção destas companhias, o Congo destacou-se na produção de vários minérios, com destaque para:
  • Urânio - maior produtor mundial
  • Cobalto - 63% da produção mundial
  • Diamantes 75%
  • Cobre – 8,5%
  • Zinco – 4,3%.
Entretanto, a produção mineira estava unicamente virada para o escoamento de produtos em bruto para a Bélgica. Portanto, não beneficiava o Congo.
A grande massa de camponeses africanos Vivia da sua economia de subsistência baseada nas culturas tradicionais. Era uma economia com uma estrutura bastante concentrada.

O Comité Spécial du Katanga, formado pela Société Générale de Belgique e pela Union Miniére du Haut-Katanga, controlava mais de metade das exportações do país. Entretanto, depois da Bélgica e das companhias, o Congo obtinha algum benefício das riquezas do pais. Já do ponto de vista político, o envolvimento dos africanos era nulo.

O sistema político belga, então considerado paternalista, implicava a subordinação do congolês sem quaisquer perspectivas de mudança. Porém, a urbanização, imposta pela industrialização, levou a um êxodo rural que, paulatinamente, tornou cada vez mais difícil o controlo da população africana. Se em 1938 onze em cada doze africanos viviam nas áreas rurais, em 1960 apenas sete viviam no campo, ou seja, 40% dos africanos viviam nas cidades.

A actividade política dos nacionalistas

A fixação progressiva de africanos nas cidades criou condições para uma progressiva elevação da consciência política. Nas cidades, começaram a surgir clubes de «evoluídos», ou seja, círculos de estudo e associações de antigos alunos, cujos membros apresentavam um modelo de Vida europeu.

Essas associações, formadas com o pretexto de estabelecer o convívio entre os seus membros, criaram a ilusão de uma promoção a nível da civilização. Surgiram, em geral, depois da Segunda Guerra Mundial, e tornaram-se embriões do movimento nacionalista, particularmente alimentado pelo ambiente de discriminação imposto pela colonização.

Se internamente o jugo colonial tinha despertado a consciência nacionalista, o catalisador da explosão política veio de fora. Vejamos em seguida alguns acontecimentos que levaram explosão política no Congo.

Em 1955, o então rei belga Baldufno I visitou o Congo e apresentou em Léopoldville (hoje Kinshasa) um discurso assimilacionista, que defraudou as expectativas dos nacionalistas.

No mesmo ano, o professor belga Van Bilsen propôs um plano para a independência da África belga, a concretizar num período de 30 anos, que devia começar com a formação de quadros e o estabelecimento, no futuro, de um sistema federal. Este Plano, apresentado por um intelectual, despertou grande efervescência entre os nacionalistas. Foi assim que, em 1956, o padre Joseph Maloula, com o apoio de Joseph lléo, fundou o movimento Conscience Africaine, cujo manifesto assentava na abolição da discriminação racial, no reconhecimento da personalidade africana e no direito dos africanos à expressão cultural e política.

Por seu turno, a Association du Bas-Kongo (Abako) presidida por Joseph Kasavubu, criticou o Conscience Africaine por não apresentar os meios práticos pelos quais pretendia alcançar os seus intentos e defendeu uma emancipação política num contexto federal e através da constituição de partidos políticos congoleses.

1957 foi o ano da independência do Gana e da aplicação da lei-quadro francesa para os territórios do ultramar. Acompanhando essa dinâmica, a Bélgica organizou a primeira eleição popular nos principais centros do Congo e do Ruanda-Urundi a fim de constituir municípios europeus e africanos, cujos burgomestres seriam indicados pelo governador. Este exercício despertou os africanos para o desejo de independência.

1958 foi um ano crucial para o movimento nacionalista congolês devido à combinação de diversos factores:
  • A Exposição Universal de Bruxelas - os congoleses reconheceram em algumas salas do pavilhão onde estavam instalados os africanos, além de terem tomado contacto com o resto do mundo, particularmente com outros africanos. A exposição produziu uma mutação; no espírito de muitos dos congoleses; confirmava-se a consciência de uma situação de inferioridade e a vontade de agir.
  • A visita do general De Gaulle a Brazzaville, no Congo francês, para anunciar a independência, teve repercussões imediatas em Léopoldville, no Congo Belga. De imediato, os dirigentes políticos congoleses juntaram-se para assinar uma petição ao ministro do Congo, reclamando um plano gradual de independência do país.
  • A Conferência Pan-Africana dos povos em Acra, Gana, na qual a delegação congolesa era composta por membros do Mouvement National Congolais (MNC) liderada por Patrice Lumumba.

O papel de Patrice Lumumba

Apos concluir os estudos primários e empregar-se como funcionário dos correios, Lumumba iniciou, através de artigos publicados em jornais, a critica ao colonialismo, advogando a igualdade entre africanos e belgas.

Patrice Lumumba

Na sua intervenção, na conferência de Acra, Lumumba deixou vincadas as suas ideias que, aliás, viriam a constituir o seu programa de luta, ao dar vivas à nação congolesa e à África Independente e ao dizer abaixo ao imperialismo, ao colonialismo, ao racismo e ao tribalismo.

Já de volta ao Congo, Lumumba reivindicou a independência imediata. Em Janeiro de 1959, eclodiu em Léopoldville (Kinshasa) uma revolta encabeçada pelo proletariado urbano que via na independência a única saída para os problemas sociais e políticos com que a colónia se debatia.

O balanço oficial dos tumultos indicava 49 mortos e 116 feridos graves dos quais se contavam quinze europeus. Apesar do rescaldo negro, que incluía ainda a prisão de alguns chefes políticos locais, o rei Balduíno reconheceu, num discurso a 13 de Janeiro de 1959, que a independência era o único fim do processo politico em curso. Para consubstanciar essa ideia prometeu a independência para o Congo, cujos passos iniciais seriam a criação de um parlamento congolês, eleito por sufrágio indirecto, e a integração racial.

Pouco depois, iniciavam-se as negociações para a independência, numa mesa-redonda belgo-congolesa, especialmente convocada para o efeito em Bruxelas.

Nesse encontro, deviam participar todos os líderes políticos; por isso Lumumba, que fora preso nos tumultos de Novembro de 1959, foi libertado unicamente para tomar parte no mesmo.
Nesse encontro colocavam-se duas questões fundamentais:
  • O calendário da descolonização
  • A Constituição do novo Estado
Em relação ao calendário, não houve grandes discussões, pois a Bélgica manifestou uma reviravolta admirável, acelerando o processo e fixando a data da independência para 30 de Junho.

Quanto ao estatuto constitucional existiam duas posições antagónicas:
  • O federalismo defendido por Joseph Kasavubu - em que se propunha a existência de estados federais fortes que tivessem à cabeça um poder central moderado.
  • O estado unitário, defendido por Lumumba.
As discussões, em torno desta matéria, terminaram com a adopção de uma fórmula intermédia, em que se ficava por um Estado Republicano, no qual existiriam um poder central forte e seis governos provinciais. Paralelamente, foi adoptada uma lei fundamental que devia vigorar até ser votada uma constituição para o país.

Entretanto, o quadro preparado para a independência apresentava duas fissuras bastante perigosas para o futuro país independente. Ora veja-se: o Banco Central do Congo continuava nas mãos da Bélgica, e o país não dispunha de quadros suficientes para tomar de imediato os destinos do país.

Em Maio de 1960, tiveram lugar as eleições para a Assembleia Nacional, nas quais o MNC de Patrice Lumumba saiu vitorioso. Lumumba foi nomeado chefe do Governo em coligação com Swendé, de origem balubakat e lléo, da etnia Bângala. Joseph Kasavubu foi eleito presidente. A 30 de Junho foi proclamada a independência.

A crise do período pós-independência e a separação do Catanga

O novo Estado enfrentou de imediato problemas graves que iriam condicionar a evolução posterior do pais. Vejamos:
  • Entre os integrantes da liderança do país nenhum deles tinha experiência de gestão administrativa, senão a liderança de algumas associações, ou seja, a um nível bastante limitado.
  • A coesão entre os membros desta liderança era quase nula. Cada um deles, além de se identificar com o seu próprio grupo étnico-tribal, tinha convicções políticas próprias. 
·       As forças centrifugas lideradas por Moise Tshombe (do Catanga) e Albert Kalondji (do Kasai) continuavam bastante fortes.

Neste contexto, poucos dias apos a independência, a força pública revoltou-se. A violência criou pânico entre a população branca, agravada pela promoção de alguns africanos a oficiais superiores. Instalou-se o caos, e o pais ficou paralisado.

Na tentativa de encontrar uma solução para a crise, a Bélgica lançou para-quedistas para controlar as principais cidades, enquanto os principais líderes do país, Patrice Lumumba e Joseph Kasavubu, decidiram pedir o auxílio das Nações Unidas. Entretanto, o momento foi aproveitado por Moise Tshombe e apoiado pelos colonos do Catanga e pelo Ministro do Interior, Godefroy Munongo, para proclamar a independência do Catanga.

Isso aconteceu a 11 de Julho, passava pouco mais de um més apos a proclamação da independência. Pouco tempo depois, a província do Kasai seguiu o exemplo do Catanga, liderada por Kalondji.

A intervenção da ONU, dos governos africanos, soviético, americano, belga, bem como a necessidade de defender os interesses econômicos no pais não conseguiram amainar o ambiente. Lumumba e Kasavubu envolveram-se em lutas pelo poder, situação que foi aproveitada por um grupo de oficiais para levar ao poder o coronel Joseph Mobutu, que decidiu mandar prender os dirigentes políticos e formar um governo de técnicos constituído pelos poucos jovens universitários de que o país dispunha. As forças armadas das diferentes regiões (Stanleyville, Catanga, Kasai, Kivu, Kwilu, etc.) protagonizaram confrontos sangrentos que envolveram as tropas congolesas e os capacetes azuis.

Foi no meio desse ambiente que, em Janeiro de 1961, quando tentava regressar à sua cidade - Stanleyville - Lumumba foi preso pelas autoridades de Léopoldville e entregue aos catanguenses, que o assassinaram.

Depois de acções diplomáticas pouco conseguidas entre 1961 e 1963, que incluíram de permeio a morte do secretário-geral da ONU num acidente de aviação a caminho do Congo para negociações, a secessão do Catanga iria terminar em Janeiro de 1963, na sequência de uma intervenção militar da ONU.

Em 1964, Kasavubu indicou Tchombé para seu primeiro-ministro e, com apoio militar americano-belga, conseguiria reduzir o perigo de uma rebelião armada. Só que, pouco depois, Tchombé e Kasavubu entrariam em colisão, pelo que o exército indicou Joseph Mobutu para presidente da República.

Depois da eliminação das bolsas de resistência, da morte de Tchombé e Kasavubu, e ainda do afastamento dos velhos concorrentes políticos de Mobutu (detidos ou envolvidos em negócios, abandonando a política), ficou aberto o caminho para a acumulação ilimitada de poder por Mobutu.

Veja alguns dos principais momentos da ascensão do poder de Mobutu:
  • 1966 - Nacionalização da Union Miniàre.
  • 1967 - Reforma monetária para estabilizar a moeda nacional e elevar a reputação do Zaire no mundo.
  • 1970 - No culminar de uma reforma política de grande envergadura, o Mouvement Populaire de la Revolution (MPR) passaria a controlar a Vida política nacional tornando-se partido único. A ideologia deste partido passa a ser resumida na palavra «autenticidade», que pressupõe encarar os problemas de frente e dar-lhes soluções adequadas com base nos próprios recursos. É esta ideia que está na origem de uma autêntica «balbúrdia» no vocabulário e nos nomes das pessoas: por exemplo, Joseph Mobutu passava a chamar-se Mobutu Sese Seko, o Congo passava a ser Zaire, Léopoldville passava a Kinshasa, etc. Tudo autêntico, originariamente local.
  • 1972 - O governo e a comissão executiva do MPR fundiram-se para formar um Conselho Executivo Nacional, cujos comissários de Estado eram dotados de funções ministeriais.
  • 1974 - Revisão constitucional, que atribuía ao chefe de Estado a chefia do Conselho Executivo Nacional, a presidência do Conselho Legislativo Nacional, a chefia do poder judicial e das forças armadas.
  • 1975 - instituída a Comissão Permanente do Secretariado Politico do MPR.

Bibliografia
SUMBANE, Salvador Agostinho. H11 - História 11ª Classe. 2ª Edição. Texto Editores, Maputo, 2017.

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