O texto narrativo (completo)
1. O texto narrativo
No dia-a-dia, o Homem depara-se com várias situações que
precisam de ser relatadas. Amiúde, estas situações são inventadas por alguém
que configura um cenário, um momento e uma série de entidades que se situam
dentro e fora do texto, para dar lugar ao que se chama narrativa. Isto equivale
a dizer que os textos narrativos não se resumem ao facto, ao vivido, ao
concreto. Estendem-se até ao imaginável, ao além — real ou parecido com o real
(verosímil ou inverosímil).
Para tal, esta entidade cria várias realidades que só têm
sentido dentro do próprio texto e que são narradas observando uma determinada
estrutura lógica, com uma sequência de acontecimentos e uma intervenção
organizada de determinados seres; realizam-se num determinado tempo e espaço e
são produzidas para um público, por um individuo e respeitando um determinado
tipo de discurso, que, de forma recorrente, irá caracterizar estes textos.
Este é o assunto que iremos abordar nesta unidade. Iremos
também analisar a concordância sintáctica entre os constituintes de uma frase,
especificamente o sujeito e o nome predicativo do sujeito.
Finalmente, proporemos a elaboração de um texto narrativo
que, de forma criativa, relate uma história que nos ensine a conviver com
vítimas de HIV/SIDA.
2.1. Narração
Segundo Reis e Lopes (Dicionário de Narratológico,
7ª Edição, Coimbra, 2002, pág. 247), o termo «narração é entendido como
processo de enunciação narrativa, como resultado dessa enunciação, como escrita
da narrativa, como processo oposto à descrição, mesmo como modo literário, em
relação distintiva com o modo dramático e o modo lírico», desempenhando, então,
uma função marcadamente activa de preparação da argumentação, pois, como
fundamenta Barthes (1975, pág. 209) apud Reis e Lopes (2002, pág. 247),
«a narração não é uma história, mas uma pr6tese argumentativa».
O critério apositivo proposto por Reis e Lopes (op. cit.,
2002, pág. 248) passa pela dinâmica incutida å narrativa, dai que se entenda «a
narração, em contraste com a descrição, como aquele procedimento
representativo dominado pelo expresso relato de eventos e de conflitos que configuram
o desenvolvimento de uma acção», sendo, com efeito, possível compreende-la em função
de um movimento temporal que transmita å narrativa a dinâmica mencionada.
A narração consiste, então, em criar uma sequência de
factos na qual as personagens se movimentam num determinado espaço à medida que
o tempo passa.
O texto narrativo é baseado na acção, a qual envolve
personagens, tempo, espaço e conflito. Assim, o texto narrativo apresenta uma
determinada estrutura, como destacamos:
- — Apresentação;
- — Complicação ou desenvolvimento;
- — Clímax;
- — Desfecho.
Registe-se que, nesta estrutura narrativa, o tempo marca
a sucessão cronológica, indica a duração ou, juntamente com o espaço, faz a contextualização
histórica, cultural e social dos acontecimentos. A ordenação dos acontecimentos
pode transgredir a ordem cronológica e resultar de outros factores, como relações
de valores — amor, ódio, corrupção, violência, etc.
Narração e narratividade
No nosso quotidiano, encontramos textos narrativos;
contamos e/ou ouvimos histórias constantemente. Mas os textos que não pertencem
ao campo da ficção não são considerados narração, pois esses não têm como
objectivo envolver o leitor pela trama, pelo conflito. Podemos dizer que nesses
relatos há narratividade, ou seja, o modo de ser da narração ou, melhor, a narratividade
incide sobre o estado específico, sobre as qualidades intrínsecas dos textos
narrativos, apreendidos ao nível dos fundamentos semidiscursivos.
Portanto, segundo Groupe d'Entrevernes (1979, pág. 14),
citado por Reis e Lopes (op. cit., 2002), «é o fenómeno de sucessão e de transformação,
inscrito no discurso e responsável pela produção de sentido».
Categorias da narrativa
1. Acção (intriga)
- 1.1. Central – constituída pelos acontecimentos principais.
- 1.2. Secundária – constituída pelos acontecimentos secundários, que contribuem para a valorização da acção central; permite identificar situações ou valores e compreender contextos sociais, culturais, ideológicos, geográficos ou outros.
Momentos determinantes da acção
- Introdução (situação inicial, apresentação);
- Desenvolvimento (peripécias e ponto culminante);
- Conclusão (desenlace).
Delimitação da acção
- Narrativa aberta – a acção não apresenta a solução definitiva para o destino das personagens; deixa a possibilidade de acrescentar novas peripécias å série de acontecimentos que foram narrados.
- Narrativa fechada – a acção e a sorte das personagens são resolvidas até ao pormenor.
Sequência narrativa das acções
As acções diversas de determinada obra relacionam-se
entre si por:
- Encadeamento – ordenação temporal das acções.
- Encaixe – introdução de uma acção noutra.
- Alternância – entrelaçamento das acções que se vão desenrolando, ora uma, ora outra, separada e alternadamente, podendo fundir-se num determinado ponto da narrativa.
2. Espaço
2.1. Geográfico ou físico
Lugar ou lugares onde decorre a acção. Diz-se geográfico
se remete para grandes espaços definidos de acordo com coordenadas geográficas,
como de latitude ou longitude; é, normalmente, identificado com pequenas
aderências físicas, podendo dizer-se interior ou exterior, fechado ou aberto,
público ou privado.
2.2. Social e cultural
Caracteriza a situação social e económica ou o meio em
que vivem as personagens.
Define as classes e os grupos sociais de acordo com os
seus interesses, as suas ideologias e crenças, os seus valores, a sua posição
na sociedade. O espaço cultural integra-se, normalmente, no espaço social,
embora remeta mais para valores culturais, tradições, costumes e formação
cultural.
2.3. Psicológico
Remete para a que cada personagem tem do espaço físico ou
de um espaço de emoções ou sensações.
3. Tempo
3.1. Da história ou cronológico
Define-se por datas ou pelo decurso e duração dos
acontecimentos.
3.2. Do discurso ou da narrativa
Obedece à sequência do próprio enunciado, podendo
alongar, resumir, alterar ou omitir os dados do tempo cronológico. As alterações
da ordem dos acontecimentos ou supressão e resumos tomam a designação de:
- Analepse – recuo no tempo, evocação de factos (flashback, na terminologia cinematográfica);
- Prolepse – avanço no tempo;
- Elipse – omissão de períodos mais ou menos longos da história;
- Resumo ou sumário – síntese dos acontecimentos que decorreram durante um certo período de tempo.
3.3. Psicológico
Resultante da vivência das personagens e do modo como
estas sentem o pulsar e o desenrolar do tempo, em função do seu próprio estado
de espirito.
4. Personagens
Protagonistas e antagonistas A narrativa é centrada num
conflito vivido pelas personagens e, por conseguinte, estas são muito
importantes no que respeita a construção do texto.
Podemos dizer que existe um protagonista (personagem
principal) e um antagonista (personagem que actua contra o protagonista,
impedindo-o de alcançar os seus objectivos). Há também os adjuvantes ou
coadjuvantes, personagens secundárias que também exercem papéis fundamentais na
história.
4.1. Caracterização
4.1.1. Directa
É feita através dos elementos fornecidos pelo narrador. É
realizada através das palavras da personagem e das outras personagens, é
efectuada mediante a descrição dos aspectos físicos e psicológicos das personagens.
As personagens revelam os seus problemas, as suas intensões ou as suas ideias
através de monólogos, de cartas, de canções, de sonhos, entre outros.
4.1.2. Indirecta
Partindo das atitudes, dos gestos, dos comportamentos e
dos sentimentos da personagem ou dos símbolos que a acompanham, o leitor forma
as suas próprias opiniões acerca das caracteristicas físicas ou psicológicas da
dita personagem.
4.2. Composição e formulação
- 4.2.1. Personagens planas – são personagens estáticas, sem Vida interior, sem
densidade psicológica, dado que não alteram o seu comportamento, nem evoluem
psicologicamente. São definidas de forma linear por um ou vários traços que as
acompanham ao longo da narrativa.
- 4.2.2. Personagens modeladas – são personagens dinâmicas e com densidade psicológica,
cheias de Vida interior e capazes de surpreender o leitor pelas suas atitudes e
comportamentos.
4.3. Papel que desempenham na economia da narrativa
4.3.1. Principais ou protagonistas
E em torno das personagens principais ou protagonistas
que decorre a acção.
4.3.2. Secundárias
As personagens secundárias participam na acção mas não têm
um papel decisivo.
4.3.3. Figurantes
São as personagens que caracterizam o espago social em
que se inserem, como as mentalidades e as atitudes culturais.
5. Narrador
5.1. Presença
5.1.1. Narrador participante
a) Autodiegético – a narração é feita na primeira
pessoa, sendo nomeadamente de carácter autobiográfico; o narrador assume o
papel de personagem principal ou protagonista.
b) Homodiegético – a narração é feita na primeira
pessoa, mas o narrador assume-se apenas como personagem secundária.
5.1.2. Narrador não participante
a) Heterodiegético – a narração é feita na
terceira pessoa, dado que o narrador não participa nos acontecimentos nem
interfere na história.
5.2. Ciência (ponto de vista, focalização)
5.2.1. Omnisciente - o narrador conduz a narrativa criando uma unidade lógica; ao mesmo tempo, penetra no íntimo das personagens, revelando o que lhes vai na alma; conhece tudo o que diz respeito às personagens e aos acontecimentos; analisa as acções, os comportamentos, os sentimentos e o pensamento dos heróis.
5.2.2. Focalização interna - o narrador contempla as personagens que criou e traça a sua análise partindo do exterior para o interior (é a expressão facial da personagem que dá a conhecer o seu estado de espírito; é o silêncio da personagem que revela os seus sentimentos; é a mimica ao serviço da expressão de estados de alma).
5.2.3. Focalização externa – as personagens são-nos apresentadas através dos diálogos,
das atitudes, dos gestos e das acções. O narrador observa, com objectividade, o
mundo físico em que se movem as personagens, observa-as, ouve-as, descreve as
suas acções, mas não «penetra» nos pensamentos e sentimentos das personagens não
podendo, por isso, dar a conhecer ao leitor, por antecipação, o que vai
acontecer.
Discurso narrativo
Havendo a necessidade de expor os factos de uma forma
límpida, de modo a que o leitor entenda facilmente o texto, recorre-se ao uso
de um discurso Claro, objectivo, organizado sequencialmente e com algumas figuras
de estilo, ou seja, estas são utilizadas com maior parcimónia do que geralmente
acontece num texto poético.
Os recursos expressivos são processos utilizados pelos autores para tornar o texto mais sugestivo e eficaz (comparação, metáfora, a personificação, a hipérbole, ironia…).
2. Concordância entre o sujeito e o nome predicativo do sujeito
Nos elementos oracionais, devemos sempre considerar a articulação sintáctica que entre eles se estabelece.
O nome predicativo do sujeito pode ser um nome ou uma expressão equivalente que se associa a um verbo copulativo ou de ligação (ser, estar, ficar, continuar, parecer) para lhe atribuir sentido, indicando um estado ou uma qualidade.
Em particular, atenta na concordância entre o sujeito e o nome predicativo do sujeito.
- O nome predicativo do sujeito concorda com o sujeito em género e número. Ex.: A rapariga estava sentada.
- Se o sujeito for composto e do mesmo género, o predicativo concordará no plural e no género dos sujeitos. Ex.: A rapariga e a mãe estavam insatisfeitas.
- Se o sujeito for composto e apresentar géneros diferentes, o predicativo concordará no masculino plural, preferencialmente. Ex.: A rapariga e o pai estavam receosos.
- Sendo o sujeito um pronome de tratamento, a concordância dependerá do sexo da pessoa a que nos referimos. Ex.: Vossa Excelência é muito bondoso(a).
Nas construções do tipo: É bom, É preciso, É necessário, É proibido, o nome predicativo do sujeito ficará no masculino singular, não havendo artigo antes do sujeito.
Exs.: Refrigerante é bom no calor.
É preciso paciência.
É necessário muita cautela.
É proibido entrada a menores de...
Havendo artigo antes do sujeito, a concordância será feita da forma normal.
Ex.: É proibida a entrada a menores de dezoito anos.
Bibliografia
FERNÃO, Isabel Arnaldo; MANJATE, Nélio José. Português 12ª Classe – Pré-universitário. 1ª Edição. Longman Moçambique, Maputo, 2010.
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