O surgimento das zonas libertadas e a emergência de novas formas de relações sociais
O surgimento das zonas libertadas e a emergência de novas formas de relações sociais
A partir dos finais de 1965, nas províncias de Cabo Delgado e do Niassa Ocidental, a FRELIMO controlava e administrava vastas regiões, apos a retirada de contingentes do exército português, isolado em quartéis e em sérias dificuldades de logística, perante a ofensiva militar das forças nacionalistas moçambicanas. Dois anos depois, em finais de 1967, as zonas libertadas na província do Niassa, já compreendiam grande parte do Niassa Ocidental, quase a totalidade do Niassa Oriental e pequenas áreas em torno das bases dos guerrilheiros no Niassa Austral. Em Cabo Delgado, estas zonas abrangiam as áreas que se estendiam a norte da linha que liga a foz do rio Montepuez à foz do rio Lugenda, junto ao Rovuma. Nestas mesmas áreas, os portugueses continuavam a dominar nas aldeias onde se encontravam os aquartelamentos das suas unidades militares, e nas cidades.
Nas zonas libertadas pela FRELIMO, procuravam-se constituir milícias populares, visando impedir a entrada do inimigo, ao mesmo tempo que se organizava o quotidiano das populações, planificando-se as actividades produtivas, a saúde e a educação. A organização da Vida nestas zonas está na origem de profundas divergências dentro da frente de libertação, desembocando numa profunda crise no seu seio.
No 2.o Congresso da FRELIMO, para se tentar ultrapassar os conflitos existentes, decidiu-se tornar as zonas libertadas nas bases materiais para o desenvolvimento da guerra, tendo-se para isso traçado directivas para o desenvolvimento da produção agrícola e artesanal, a partir duma gestão cooperativista, e do aprofundamento dos conhecimentos científicos.
Estas transformações fizeram-se, muitas vezes, em resultado da própria implantação da FRELIMO nas diferentes regiões.
Em Cabo Delgado, por exemplo, a maioria das machambas manteve-se individual e a forma de produção dominante era familiar. No período da guerra, os camponeses distinguiam dois tipos de produção:
- · Produção destinada a alimentar o exército guerrilheiro, os postos de saúde e as escolas.
- · Produção destinada ao consumo familiar.
As cooperativas que se estabeleceram durante a guerra eram, fundamentalmente, de comercialização. Estas recolhiam uma certa quantidade de produtos agrícolas, como castanha de caju, gergelim ou amendoim, que levavam para a Tanzânia para trocar por sal, açúcar, Óleo, roupas e enxadas. No regresso, estas mercadorias eram novamente trocadas com os camponeses. Nestas operações, as cooperativas realizavam os seus lucros. Nesta área, importa recordar a produção de artesanato, como a célebre escultura maconde, sendo usada para fins de propaganda e relações públicas.
As bases militares da guerrilha, ainda que continuassem dependentes da produção dos camponeses, tinham também a sua própria produção. A sua actividade produtiva estava sujeita a programas de tarefas diárias, dedicando-se à agricultura, caça e ao transporte de água.
A organização da Vida nas zonas libertadas pressupunha também um novo relacionamento entre guerrilheiros e a população, que passava pelo novo tipo de poder – o poder popular. A nova administração popular procurava que os camponeses, participassem juntamente com os guerrilheiros, nas discussões e na procura de soluções para os problemas locais, sobretudo no que se referia as actividades produtivas. O II Congresso da FRELIMO, em 1968, viria a aprovar a tese do estabelecimento do poder popular, em resposta às políticas anti-populares do chairman de Cabo Delgado e das chefias tradicionais do Niassa. Foi decidida a criação de Comités Populares de Gestão, eleitos directamente pelas populações.
Bibliografia
SOPA, António. H10 - História 10ª Classe. 1ª Edição. Texto Editores, Maputo, 2017.
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